"Se for falar mal de mim me chame, sei coisas horríveis a meu respeito" (Clarice Lispector)
sexta-feira, novembro 24
Beija-flor
Sempre pensei que os beija-flores fossem eternos. Cada um com sua roupagem única, pintura exclusiva, assinada por artista caprichoso. Dezenas de vezes topei com pardais, pombas, canários e até urubus estirados chão afora. Espalhados em monturos de plumagem e sangue, alguns achatados como se folha de papel fossem. Cães e gatos também. Em qualquer parte da cidade é possível, em algum momento, se deparar com carcaças estraçalhadas por desumanos pneus. Não se esquece daqueles olhos vidrados a fitar um nada.
Nas estradas que cortam nosso Brasil, já vi tamanduás, onças, capivaras, lontras, além de bois e cavalos, jogados como sacos para o acostamento.
Nunca, nunca tinha visto um beija-flor morto. Sempre os vi anjos e anjos não morrem.
Assim pensava e jurava de pés juntos: os beija-flores são eternos. Não, infelizmente não o são.
Nesta semana, do nada, deparei-me com uma pequena joia em canto de calçada. O sol bem à minha frente mostrava apenas estranha figura refletindo multicor. Frágeis arco-íris envolviam aquele pequeno amontoado de quase nada.
Dei alguns passos com palma da mão em viseira, ainda sem saber o que era. Parecia uma caixinha de joias tombada, mostrando suas riquezas; miúdas contas e pedras preciosas em perfeito corte lapidário. Coloquei-me contra o sol e só então entendi o tamanho da tragédia. Via, pela primeira vez, em toda minha vida, um colibri morto. Seu delgado e longo bico apontava para o céu. Era lá o seu lugar. Entre flores coloridas e perfumes transcendentes, a banhar-se em pequenas gotas de chuva de primavera sobre largas folhas, riscando o tempo e abrindo caminho ao vento. Nunca ali.
Olhos foscos agora em um nada ver. Sentei ao seu lado. Um pouco de mim ali morria. Clichê, lugar comum? Pode até ser, mas era a mais pura verdade. Para alguém que sonhava a certeza de que estas minúsculas estrelas vivas não morriam, foi um mais perder da infantil que teima em nos acompanhar pelo tempo.
Talvez o envelhecer seja isso: o perder das falsas verdades puerícias. A reserva destes fragmentos que, quando em vez manda recado, vai-se aos poucos esvaziando, esvaziando até quase nada restar, incrustado apenas em apagadas retinas. Ao mesmo tempo em algum canto, vai se acumulando a borra da vida. As frustrações, o não realizado tão forte de tempos atrás, que, resignados e exaustos, deixamos de lado. As utopias, sempre elas, perdidas. Abdicamos de tanto e, às vezes, descobrimos que foi por tão pouco.
Descobri, pois, de forma súbita que os beija-flores, infelizmente, morrem, assim como tudo mais. Mas disso fica lição e crescimento, os sonhos. Ah, os sonhos! Estes não envelhecem jamais mesmo, cantou a voz de anjo Milton. Não morrem e se multiplicam, ramificam, nos seguem/perseguem até o fim do caminho.
Resta consolo de que outros milhares de cuitelos continuarão saga da eternidade, pois não tem aquele, por mais sisudo, frio e insensível que seja, que não pare um segundo e, mesmo sem querer, deixe esboçar, ainda que ligeiro, sorriso de criança. Pode não demonstrar, mas sente.
Assim, trazendo paz também aos carrancudos e infelizes, recupero o meu devanear e torno a acreditar na imortalidade dos beija-flores, dos anjos e dos sonhos.
Dessa forma, “Em meio a tantos gases lacrimogênios/Ficam calmos, calmos/calmos, calmos, calmos/Lá se vai mais um dia”.
Publicado em Jornal Olha no Diário (Uberlândia)
quarta-feira, novembro 22
Gênero
Vivemos um momento de overdose de "politicamente correto" (PC). Já brinquei seriamente sobre isso em outro escrito e olha que faz muito tempo. Por incrível que pareça o PC evolui em velocidade cósmica, não havendo um dia sequer em que não apareça uma nova imposição e torcer de narizes para aqueles que não seguem as regras doutrinárias de alguns que se acham vanguarda, mas na realidade são uns chatos caretas. Cabelo comprido ou roupas diferentes não fazem ninguém ser "cabeça". No primeiro caso temos um exemplo singular bem perto de nós.
Os falsos doutos em comportamento às vezes me lembram mais Black blocs sem causa definida do que mestres capazes de modificar léxico. Olha só, modificar para uso em suas tribos e guetos tudo bem, mas impor é outra coisa.
Não que eu seja adepto fervoroso da gramática normativa, basta levar em conta que na maioria de minhas crônicas, prosas ou poemas uso e abuso da linguagem coloquial. Vejo-me peão, prostituta, dono de venda, matuto, andarilho louco varrido, anjo, santo ou rapadura. Perco-me em minhas frases longas sem ponto, nem vírgula. Busco a sonoridade dos viventes bicho ou gente, ar, mar, vento. Tudo isso para desespero de revisores. Aqueles que bem me conhecem já se acostumaram e tiram de letra as letras que faltam e falas que contam. Contudo, a imposição moralista de uma vanguarda pouco ousada me aflige/agride. Não me imponham nada, pois farei o contrário.
Aqui a história é deliciosamente outra. Uma amiga me deu um puxão de orelha por algum dito. Brincou, acredito eu, com frase usada e reforçou o que tinha tomado conhecimento por meio de grande amigo, médico e pródigo escritor cuiabano. Sinto que os mato-grossenses, assim como nós mineiros e paraibanos, já nasceram com este "defeito" no juntar letras. Não digo que seja bom ou ruim o resultado, pois é como jogar futebol. Uns nascem com o dom, outros, como este que vos fala, vêm ao mundo por acaso. Nunca acertei um chute e só fiz gol batendo bola sozinho.
Não é o caso de meu querido amigo, que, repito, domina a escrita como poucos. Foi ele que me contou pela primeira vez a história do "X" como igualador de gênero (não tem igualador no dicionário, me dou ao direito). Assim, Senhor e Senhora são substituídos por Senhorex. Nesta toada temos também artitex, veterinarex e meninex, que substitui numa boa menino e menina.
Em reunião ou comício muitos canditatex dirão: Companheirex! Aos brados ou em reunião solene: Senhorex, autoridadex, meu povex, bom dia... e segue o discurso. Em bom português, lá se foi o boi com a corda.
Lógico, claro e límpido que o simples uso de um X não vai reduzir o famigerado preconceito, as fobias, o ódio pelas opções individuais. O respeito à diversidade de gênero é base de tudo. Basta de caretice, de hipocrisia. Para os ou ox que ainda se sentem perturbados com tantas e boas mudanças, sugiro leitura de “Livres & Iguais”, da Organização das Nações Unidas (ONU). A desinformação é uma das principais fontes do preconceito.
O mundo mudou e, repito, não são sinais ou letras que vão ajudar a acabar com a essência da intolerância, da cegueira moral. Tenho fé que tanto ódio se desvaneça de uma vez por todas. Pois se ainda tivermos que usar de subterfúgios estaremos contribuindo cada vez mais para o distanciamento e segregação. Assim, deixemos o x para as palavras que o utilizam, tais como Xerox, Jontex, Fax, Climax, Fênix, Ônix, Tórax, Durex ...
Dura lex, sed lex
Publicado em Uberlândia Hoje em 22 de novembro de 2017
quinta-feira, novembro 16
De árvores e fakes
“A Noruega se tornou o primeiro país do mundo a se comprometer com o fim desmatamento em todo o território nacional, após decisão do Parlamento na semana passada. Para cumprir com a meta, o governo proibiu o corte de árvores e baniu a compra e a produção de qualquer matéria-prima que contribua para a destruição de florestas no mundo.”
Fonte: Revista Veja
Assim, com espanto e alegria e muita mineira desconfiança recebi a notícia pelas redes sociais. Afinal quase tudo que se torna viral na rede não passa de grande bobagens e pior, tem sempre um mundo de gente que acredita e compartilha, bom se não o fizesse não seria tornaria viral ará!
Entendo a tão conhecida preguiça de ler das gentes que vivem coladas em aplicativos, redes sociais e agora, super felizes, passam grande parte de suas vidas caçando Pokemons. Caçada esta até admissível para crianças e adolescentes, com parcimônia é claro. Sobriedade e caldo de galinha nunca são demais. Mas velho barbado? Moça feita com carteira de motorista, matriculada em curso superior e de namorado a tiracolo? Tem dó, usem esse tempo para ler um bom livro, uma revista que não seja de futilidades por favor. Aprende outra idioma, tocar um instrumento musical e ainda sobrar tempo para se exercitar e sair dessa mândria crônica.
Todos estamos sujeitos a pagar mico com as armadilhas das redes. Outro dia, (já tem tempo, mais de ano, assim como a notícia vinda da península escandinava), leio sobre a morte do genial escritor Ariano Suassuna ,adjetivo bem empregado viu mestre esteja onde estiver, achando tratar-se de homenagem de sua partida – ele nos deixou em 2014 – não pestanejei e compartilhei preito. Sem ler, criatura, sem ler o link da postagem!
Só depois fui conferir fonte, postei sem ler, não tinha mais volta, a meada estava feita, algum babaca tinha postado ou compartilhado a velha matéria do passamento do grande escritor. Não demorou segundos, tenho amigos antenados e felizmente cultos em minha lista, veio a gozação cética.
Tentei apelar para o famoso “morreu para você filho (leitor) ingrato, pois continua vivo em meu um coração” do folclórico ministro de JK, José Maria Alkmin.
Não teve jeito, cai feito um patinho ou um alienado “webiano” da vida.
Esclarecimento: Quando reforcei o “Genial” relembrei fantástica entrevista onde, ao ler em jornal guitarrista da banda Calypso Chimbinha ser chamado de genial.
O mestre Suassuna disparou: “Se gasto adjetivo “genial” com Chimbinha, o que vou falar de Beethoven?”
E assim vamos levando a vida. Infelizmente os fakes, as mentiras sinceras ou não, os Pokemons, Chimbinhas e as novelas são mais palatáveis do que o duro cotidiano individual do ganhar o pão de cada dia.
Quantos realmente se interessam em saber que a Noruega proibiu corte de arvores? Qual a importância disso para a grande maioria das pessoas – não,"grande maioria", não é pleonasmo:
“A metade, juntada a mais um, constitui a maioria; a grande maioria seria muito mais que isso, portanto a expressão não pode ser considerada um pleonasmo”
Quem se importa? O que vejo todo santo dia são milhões de pedidos de corte de árvores, seja na rua ou nos quintais.
E assim minha gente, por estas e outras , o velho e centenário óleo perto do DMAE, lá no alto, de tamanha tristeza e desgosto, inconformado com a gente humana, secou e morreu.
Publicado em Uberlândia Hoje e no Jornal Voz Ativa de Ouro Preto em14 de novembro de 2017
quarta-feira, novembro 8
Timeo hominem unius libri
Falar da ocupação do cerrado em uma época onde a palavra ecologia soaria mais para algo como os “estudo dos ecos” é maniqueísta demais, perigosa simplificação de um tempo. E como toda simplificação, segundo o psicanalista Raymundo de Lima, “geralmente nasce da intolerância ou desconhecimento em relação à verdade do outro e da pressa de entender e reagir ao que lhe apresenta como complexo”, corre-se o risco de ser injusta.
Seria algo como condenar os descobridores por levar Pau-Brasil daqui na então colônia ou reprimir o naturalista Charles Darwin por ter arrancado de seu habitat natural milhares de plantas e animais. Ou ainda crucificar Marco Pólo por trazer a pólvora para a Europa, ou pior, execrar os chineses por terem inventado o papel, algo tão politicamente incorreto do ponto de vista das árvores.
Uma discussão destas carece de profunda avaliação histórica.
Quando daquela ocupação do cerrado, nada ou muito pouco se sabia sobre aquecimento global, de emissão de gases poluentes, de efeito estufa ou camada de ozônio. Como também o termo “agrobusiness”, cunhado por Davis e Goldberg em Harvard, até onde sei não havia ainda chegado ao Brasil.
A visão ecológica da sustentabilidade veio bem mais tarde.
Segundo a ONG Amazônia-Brasil “O movimento ecológico surgiu no Brasil nos anos 1970 denunciando os efeitos ambientais do modelo de desenvolvimento da época e os riscos de usinas nucleares, o que influenciou a criação de novas áreas protegidas. O principal marco é o Manifesto Ecológico de 1976, liderado pelo gaúcho José Lutzemberger”.
Voltando ao cerrado. Inicialmente foi o interesse por ouro e pedras preciosas que levou à sua exploração, isso ainda no século XVII. Contudo, historiadores afirmam: “Somente a partir da década de 1950, com o surgimento de Brasília e de uma política de expansão agrícola, por parte do Governo Federal, que iniciou-se uma acelerada e desordenada ocupação da região do cerrado, baseada em um modelo de exploração feita de forma fundamentalmente extrativista e, em muitos casos, predatória.”
Numa época em que o cerrado era desprezado tanto do ponto de vista econômico quanto poético (algumas raras e maravilhosas exceções), tudo que pudesse ser feito para atrair investimentos e principalmente fixar gente era bem-vindo. É duro? Com certeza o é.
Mas era a realidade de uma época. Muito diferente das ações descomedidas dos dias de hoje onde a falta de informação não pode ser desculpa para a destruição de nosso ecossistema, de nosso planeta. Todos, hoje, sabem muito bem o que estão fazendo.
O ex-governador Rondon Pacheco foi sem sombra de dúvidas um visionário. Com as informações disponíveis à época fez o que deveria fazer para o desenvolvimento da região, e o fez por amor à sua terra. Tenho plena convicção que hoje, municiado tecnicamente pensaria duas vezes, e com certeza encontraria opções outras para o desenvolvimento regional, mas encontraria! Bem diferente de alguns hoje que mesmo de posse de todas as informações e de todo conhecimento disponível, simplesmente fecham os olhos e atropelam a razão e a sensatez e destroem, sem critério ou visão de sustentabilidade mínima e sentimento por sua terra, sua gente.
Tomaz de Aquino, o santo, estava coberto de razão: “Timeo hominem unius libri”, ou “Temo o homem que só conhece um livro”.
Se estiver enganado estendo minha mão à palmatória de bom grado.
Publicado em Uberlândia Hoje em 08 de novembro de 2017 ( Angústia de uma década)
quarta-feira, novembro 1
Estranheza
Noite encalorada, nem brisa mansa para balançar folhas de árvores
havia. O sol de verão esquenta tudo, jardim e horta murcham rápido. Uma
tarde sem aguar planta já mostra sinal de tristeza, baixa/encolhe. Terra
racha que nem leito de rio seco.
Noite estranha. Deitado, buscando sono que não vinha, olhos virados para o céu de janela aberta até onde dava, vontade de nem parede ter. Sem camisa, sem lençol. O cortinado não tem como tirar, pois aliado de primeira hora de calor, mesmo no seco vem hordas de pernilongos cantadores. Dorme não, desassossego fica imenso.
Noite estranha. Deitado, buscando sono que não vinha, olhos virados para o céu de janela aberta até onde dava, vontade de nem parede ter. Sem camisa, sem lençol. O cortinado não tem como tirar, pois aliado de primeira hora de calor, mesmo no seco vem hordas de pernilongos cantadores. Dorme não, desassossego fica imenso.
Ponho a escutar o silêncio quente. Nada, só zumbido pregado no véu
protetor. Calor. Dou o dedo para mosquito sugar, quando sinto a
voracidade e pressa dela afasto. Parece que ouço o seu xingar nervoso.
Carece de meu sangue para amadurecer ovos e por cria no mundo. Então, só
elas usam sangue no comer. Eles não. Vivem de seiva mesmo quente em dia
como hoje. Elas não! O sangue nosso é seu buscar para perpetuar. Eles é
que cantam zoada em nossos ouvidos. Dizem que é para distrair incauto
enquanto fêmeas se banqueteiam na outra ponta, lá nas canelas. Só se dá
conta quando vem a coceira. Nada de sono. Suor aumenta. Ligo ventilador
em busca de refresco. O cortinado, como vela de barco de pesca, como
saveiro, se joga em um mar de pensamentos. Melhora um pouco, a quentura.
Do nada um canto triste e forte de pássaro preto rompe a noite
vestida com sua cor. Boto atenção no não normal do feito. Pia/canta uma,
duas, três vezes. Sinto agonia nesse cantar noctívago a campear tarde
assim. Penso em levantar e buscar saber. O abafamento me põe preguiça e
me deixo ficar, mas alerta. O canto volta a fazer-se ouvir. Estranheza.
Será filhote perdido? Será mãe a buscar cria que não encontrou ninho?
Talvez. Penso o pior: será gente humana sempre carregando fardo de
maldade, ruindeza, que roubou filhote para amansar em gaiola? Este
sentimento me tira de vez o dormir. Têm tantos assim, que acham motivo
para prender cantos como se deles fossem senhorios.
Não consigo me levantar, a noite será longa em pios/cantos, tristeza.
Lá adiante um frescor e, sem perceber, fadiga me leva a sono curto, repleto de pesadelos, cantos tristes. Sonho com gaiolas e prisão.
Acordo em trapos.
No caminho da lida vejo de canto de olho gato sair ligeiro de moita e em certeiro bote levantar em penas uma rolinha carijó. Desjejum farto este terá.
Virando a esquina, a um braço de meu rosto, casal de beija-flores dança em namoro. O aprender a ver e ouvir o que rodeia tem um triste/alegre integrar. Avanço com sono bruto para encarar um nada fazer. Ando sem serventia para uns. Não é meu querer, mas sigo a cumprir tabela.
Será predição aquele pio triste? Acredito nisso não. Só as gentes premeditam o mal e sinal não mandam.
Publicado Jornal Uberlândia Hoje em 01 de Novembro de 2017
Escorpiões
Como já mostramos na última edição, moradores de vários bairros de Sabará estão sofrendo com a infestação de escorpiões. Os artrópodes foram encontrados principalmente nos bairros Águas Férreas, Villa Real e Morada da Serra, tendo inclusive invadido a Escola Municipal José Rodrigues da Silva, Morada da Serra, levando pânico a pais, alunos e funcionários.
Nesta edição conversamos com um especialista sobre o tão temido animal, William H. Stutz é médico veterinário sanitarista especialista em animais peçonhentos da Secretaria de Saúde de Uberlândia e Colaborador da Coordenação Nacional de Controle de Animais Peçonhentos do Ministério da Saúde. Ele esclarece qual o ambiente propício para o aparecimento, o que devemos evitar e como se proceder caso aconteça algum acidente e destaca ainda os benefícios do escorpião. Estranho? Não, por incrível que pareça esse bicho tão rejeitado tem suas qualidades.
O médico explica que os escorpiões se adaptam muito bem ao ambiente humano, pois ali encontram tudo que necessitam: água (umidade), abrigo (entulho, jardins exuberantes, quintais sujos, caixas de passagem e gordura quebradas) e alimento (principalmente baratas).
Logo, ele destaca que para impedir o aparecimento de escorpiões as pessoas devem evitar as situações citadas, mantendo os imóveis limpos e livres de baratas e ainda vedar o possível acesso deles às casas, fechando as caixas de passagem e gordura e também os ralos de banheiros e áreas de serviço, utilizando ralos giratórios ou equipamento de vedação próprio. É importante acondicionar o lixo adequadamente e entregá-lo para o lixeiro nos horários de coleta. “Somos donos do lixo que produzimos. Nunca devemos jogar lixo em terrenos baldios, pois este atrairá insetos e consequentemente escorpiões”, ressalta.
Segundo relatos dos moradores, a infestação na cidade é do escorpião amarelo (Tityus serrulatus) que de acordo com o especialista é o que oferece maior gravidade em seus acidentes e, é o que predomina em Minas. Ele explica que é a espécie que se espalha mais rapidamente pelo Brasil posto que sua reprodução se dá por partenogênese ou seja, só existem fêmeas nesta espécie. A maioria das aproximadamente 160 espécies do Brasil apresenta dimorfismo sexual, ou seja, existem machos e fêmeas, diferente do escorpião amarelo. Outro dado preocupante, Minas é o estado campeão de acidentes e óbitos por escorpião do país, sinal que devemos ficar mais alertas.
William Stutz diz que em caso de acidente com escorpião deve-se procurar orientação médica imediatamente, pois somente ele poderá avaliar a necessidade ou não da utilização do soro antiveneno. Ressalta ainda que não se deve passar nada no local e que uma bolsa com água morna ajuda um pouco aliviar a dor, até chegar ao socorro. O hospital referência na região é o João XXIII, em Belo Horizonte, para onde a pessoa deve ser encaminhada imediatamente. O veterinário destaca também que crianças, idosos e enfermos com baixa imunidade são os grupos menos resistentes ao veneno do escorpião, tornando o acidente ainda mais grave, porém, todo caso deve ser avaliado.
Embora o veneno do escorpião possa matar em poucas horas, ele tem suas vantagens. Segundo o especialista, o veneno do escorpião tem uma série de propriedades terapêuticas, além do uso de seu próprio veneno para produzir o soro que salva. Porém, por ser um animal sinantrópico (aqueles que colonizam habitações humanas e seus arredores retirando vantagens em matéria de abrigo, acesso a alimentos e a água) a convivência se torna impossível com gente humana. A captura desses animais vivos e o envio para instituições de pesquisa deve ser objeto de atenção dos órgãos públicos. Ação esta que, além de ajudar na pesquisa, diminui expressivamente a população dos animais em áreas habitadas, reduzindo o risco de acidentes. Os órgãos de saúde devem realizar sistematicamente captura, busca ativa de escorpiões como preconizado no Manual de Controle de Escorpiões do Ministério da Saúde (disponível para download no site do Ministério).
Para finalizar, o médico veterinário salienta mais uma vez que limpeza, acondicionamento e destinação adequada de lixo significam pouquíssima chance de presença de escorpiões.
Publicado em Jornal Folha de Sabará em 31 de outubro de 2017
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