segunda-feira, julho 25

Sinal fechado


PS: As letrinhas publicadas em vermelho... bom as letrinhas vermelhas...



"– Olá! Como vai?
– Eu vou indo. E você, tudo bem?"


– Oi moça, sumiu!
− Nossa quanto tempo, que bom te encontrar. Fazendo compras?
− Não, só olhando o movimento, cores de vitrinas. Observando gente, pensando na morte da bezerra, como sempre.
"– Tudo bem! Eu vou indo, correndo para pegar meu lugar no futuro… E você?"

− Sumida daquele tanto, onde anda escondida?
− Nada, quase não saio. Ando por aí, no Facebook e tais.
− Que legal, vou solicitar amizade. Você aceita, pode ser?

"– Tanta coisa que eu tinha a dizer, mas eu sumi na poeira das ruas…
– Eu também tenho algo a dizer, mas me foge à lembrança!"

− Claro, vamos ter mil encontros que nem te conto. Tanta coisa para conversar e por em dia.
− O que anda fazendo?
− Nada demais, o de sempre. Muita prosa boa no Twitter. Sabe como é. E você?
− Fazendo minhas corridinhas, vigiando passarinho, pôr do sol, nascer de lua. Estrelas e tons de verde…

"– Quando é que você telefona? Precisamos nos ver por aí!"

− Olha me dê seu telefone.
− Pô, que legal, vai me ligar? Poderíamos aproveitar o frio e saírmos para tomar um caldo.
− Não vai dar, agradeço, fica para uma próxima vez. Agora que tenho seu telefone, vou te adicionar no Whatsapp. Vai ser bom retomarmos nossos contatos.
− É mesmo. E se a gente marcasse um chopinho?
− Difícil, pois tenho encontros com amigos que estão longe e até com alguns aqui da cidade pelo Skype quase toda noite, mas quem sabe não é?
− Nem um cineminha um dia?
− Você tem Netflix? Estou acompanhando cada série fantástica. Já assistiu Game of Thrones?
− Pensei na telona.
− Ah não, dá muito trabalho! Além do mais tem que sair de casa.
− Podíamos marcar um vinho então e ouvir boa música, que tal? Tenho uma coleção…
− Aí é legal. Tenho cada playlist no Spotify e do Youtube que você vai horrizar.
−… de vinil…

“- Me perdoe a pressa, é a alma dos nossos negócios!
– Qual, não tem de quê! Eu também só ando a cem!”

− Bom, tenho que ir. Foi maravilhoso te ver e nos veremos muito mais agora que temos nossos contatos. Vou ver umas coisas ali na frente.
− Nossa, será que nessa galeria tem wifi?
− Claro que tem.
− Sabe a senha?
−Sei… haja saco.
− Tudo junto?
− Acho que sim, sempre é.

"– Eu prometo, não esqueço, não esqueço…
– Por favor, não esqueça, não esqueça…
– Adeus! – Adeus!
– Adeus!”

Muito obrigado Paulinho da Viola, na voz de Chico, por seu “Sinal Fechado”. Saiba que, por mal dos pecados, os sinais andam fechando e abrindo ligeiros demais. As gentes se fechando em bites, gigas e games. Prosa anda rara e a calma pressa interiorana substituída por guerra, pressa, sobrevivência. “Viver anda cada vez mais perigoso” (Rosa/ Riobaldo)

"Gentes tão escondidas. Reclusas, se negam ao perdão. Descrença que entristece. Sigo viagem.
Viver é muito perigoso… Porque aprender a viver é que é o viver mesmo… Travessia perigosa, mas é a da vida. Sertão que se alteia e abaixa… O mais difícil não é ser bom e proceder honesto, dificultoso mesmo, é saber definir o que quer e ter o poder de ir até o rabo da palavra.”

"– Pra semana…
– O sinal…
– Eu procuro você…
– Vai abrir, vai abrir…
– Eu prometo, não esqueço, não esqueço…
– Por favor, não esqueça, não esqueça…"







Correio de Uberlândia 25 de julho de 2016 - quase fim de férias

quinta-feira, julho 21

Bezerro





Foto Trilha dos Tucanos

Desespero de fazendeiro, só criava gado à larga, solto no pasto, no mato. Era bicho prá todo lado, embrenhado em grotões onde cavalo nenhum conseguia chegar. Reconto essa história sem tirar nem por. Foi um acontecido longe, pelas bandas da Serra do Cipó, coladinho em Conceição do Mato Dentro, que um dia foi da Comarca de Sabará, depois de Serro Frio e chegou a chamar Conceição do Serro.

Quem disse que ele conseguia peão que ficasse? Na primeira hora do dia, já se via desespero, num aqui não fico não homi. Como juntar gado brabo desse jeito, de investir em arreio de montaria? Assim foi. Tinha que vacinar o rebanho. Fiscalização avisou. Suava desespero. Fazer o quê da vida?

Estava assim na varanda, sentado em banco comprido de madeira jacarandá, lustroso de tanta bunda alisar, quando chega a pé homenzinho miúdo, franzino que só. Calça na canela e sandália de couro cru. Camisa amassada indicava viagem longe. De bagagem um quase nada. Parou assim parado, olhando chão. Observado foi sendo.

Passado o tempo de timidez, murmurou:
— Há de ser aqui que andam de precisão de vaqueiro? Me contaram lá em Conceição, me ponho na sua vontade, que trabalhar careço.

Olhou aquela figura pequenina, dos braços fraquinhos, pensando se ria ou chorava. Dá conta nunca da empreitada, sofismou. Mas tinha solução que outra fosse?

Contou o serviço de juntar o gado para o curral. Tinha que ser todos. Rês nenhuma poderia ficar para trás perdida.
— Vou lhe arrumar cavalo bom e se quiser começar amanhã está contratado, pois já é hora de almoço e seu dia não ia render.

— Agradeço patrão, mas almoço fica prá quando voltar. Quero cavalo não. Vou a pé mesmo. É só apontar direção da bicharada.

— Sem cavalo ou mula? Endoidou? Contaram a braveza dos bichos?

— Contaram patrão. Ligo não. Sigo assim mesmo e se não chegar todos nem paga aceito.
Sendo assim, apontou o caminho.

Fazendeiro balançou a cabeça. Deve ser doido varrido, mas quer, deixa tentar. Assim, faço ao menos caridade em dar de comer quando voltar triste.

Eu não vi, pois é história repicada, mas contam que esse moço miúdo ficou emprenhado a correr dia todinho. Correu mato, cerrado, serra e grotão, açodando um por um dos bichos. De mamando a caducando trouxe todos.

Fazendeiro ainda triste na varanda levantou os olhos, esfregou para ver e não pensar desverdade das vistas. Descendo a serra vinha manada rumo ao curral. Correu sentar no varão da porteira a contar, apontador.

Todos estavam ali, faltava nada.
— Moço de Deus, mas conseguiu feito nunca produzido, e a pé! Conta, deu muito trabalho?

— Olha patrão, trabalho, trabalho, os grandes e os sobre ano deram não. Mas aquele bezerrinho amarelo me deu suador, pois o bichinho é ligeiro e esperto, conhece caminho.

Bezerro amarelo? Uai seu moço, tem vaca aí não! Só macho. Mostra o tal. Subiu na cerca e apontou o canto mais longe: Olha lá ele!

Olhou seguindo o dedo e arregalou os olhos em espanto. O bezerro que o cabra tinha tangido, no seu correr sem parar, era um veadinho-campeiro, veio no afoito, no engano. Vai correr assim lá em Minas, seo moço!









Jornal Correio em 17 de janeiro de 2016

e

Jornal Voz ativa - Outro Preto Minas

terça-feira, julho 12

Sonho realizado

Mais um sonho profissional realizado. Orgulho de fazer parte de  equipe tão fantástica.
Caminhos escolhidos, abraçados com paixão.


Clica na imagem que amplia

Para baixar o Manual em PDF seguem os links 

http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/publicacoes-svs  (página “Publicações da SVS”, na aba “Zoonoses”)

http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2016/julho/08/manual-zoonoses-normas-2v-7julho16-site.pdf  (link direto)

segunda-feira, julho 11

Moletom





Frio que não quer ir embora força a gente a fazer cada uma! Roupa de frio de ruar (ato de ir para rua, bater pernas, cair no mundo). Frase muitas e muitas vezes gritada por mães ou avós aflitas: Já vai ruar outra vez menino!! Já é rara. Agasalho de ficar em casa, de dormir, então, nem se fala. Tomar banho e vestir o quê para, confortavelmente, se deixar ficar em sofá a ler, ouvindo boa música ou mesmo vendo televisão? Não tinha. Criei coragem e fui a lojas garimpar algum do meu agrado.A falta de costume me fez espantar com o tamanho das lojas visitadas. Imensas, cheias. De roupa, gente pouca.

Funcionários sem identificação seguindo tendência, se misturam a potenciais fregueses, ao que ficamos com cara de boi sonso, olhando para ver se dão sinal de vida de vendas ou se são outros clientes. Achei que cliente era só de consultório, não é não. De freguês a cliente em um dia de compras. O jeito foi me virar sozinho e procurar o departamento de moletons. Tinha que existir um, ora.

Depois de muito andar, já sentia o frio diminuir. Achei o tal lugar onde os moletons se escondiam, um sobre o outro, parecendo dizer em triste murmúrio: — Me leva não! Olhei um, olhei outro e revirei a pilha tentando não desorganizar. Cáspita! Qual seria meu tamanho? Acostumado com números 38, 40 e tais, aqui eram letras, como nas camisetas.

O jeito era experimentar. Agarrei um de cada cor e, outra luta, foi achar um provador, que agora se chama “trocador”. Trocador pra mim é de ônibus. Segui busca. Até aqui não havia sido abordado por ninguém da loja. Nem alma penada chegou, com sorriso ou cara feia, para perguntar que raios estava fazendo ali. Achei! Não só o provador, como também um alguém que, rapidamente, contou as peças que carregava e me deu uma ficha, além de seco olhar.

Cabine de experimentar roupa consegue ser menor do que banheiro de ônibus ou avião. Alguns ganchos, um espelho, e banquinho, cortina que mal fecha. Ginástica de contorcionista para desamarrar o tênis, equilibrar em uma perna só, cabeça encostada na parede de compensado, três pulinhos para um lado e quase me vi no corredor aos gritos de “Abrem-se as cortinas”! Celular cai chapado, carteira some e chaves do carro se escondem como coelho ligeiro em meio a tanto pano. Comecei a suar, o calor só aumentando.

As medidas. Meu manequim é um quase nada. O tamanho P fica curto na canela. O comprimento M faz a barra arrastar no chão. Jesus Cristinho, o G fica uma marmota! Mais acrobacia para vestir a calça e calçar tênis. Um serviu, mas a cor não era a que eu queria.

Recolho tudo, saio de cadarço desamarrado, entrego para a moça roupas e ficha. Retorno ao canto dos moletons e pego mais um tanto de modelo diferente. O trocador fica longe dos moletons, fiz umas tantas viagens. Suor já brotando nas têmporas e testa. A moça me estende outra ficha e as chaves do carro, que ficaram no monte. Primeiro sinal de humanidade. Acho que ela estava ficando com dó de mim. O calor que sentia lembrava o de um bom treino de academia. Quase não conseguia tocar o tecido quente do experimentado.

Exausto, me dei por vencido, pois nada me servia. Com um calor desses, que moletom que nada! Comprei, sem experimentar, um calção de corrida. Saí feliz da vida.






Em Jornal Correio 10 de julho de 2016

segunda-feira, julho 4

Cometa




Foto  Comet  Lovejoy :  Sky and telescope

Valdelândio, por todos nomeado Vau, era sonhador incorrigível. Vau, por facilidade no chamar, já que seu nome de batismo era difícil de pronunciar, principalmente depois de noitada no boteco da vila. Vau ficou. Não era de raso de córrego, de água nas canelas, nem sujeito pouco profundo. Nas ideias e nas gentilezas era cabra de muito conteúdo, muita história, vivência. Quando pegava a contar, até mosquito se aquietava a ouvir, desprotegido, das taruíras que perdiam fome e instinto, e paravam a balançar cabeça escutando. Pois me conte, se lagartixa é dita surda? Ali elas conseguiam ouvir e bem escutado.
Dava conselho para criança e gente erada, sabia.

Tanto sabia e não guardava nada, generoso que só. Vau um sonhador sem limites. Gostava de uma caninha de engenho, pelo sabor conhecia até variedade da cana. Cana Rosa, Fita, Bambu, Carangola, Cabocla, Preta e sabe-se lá qual mais. Porém gostava mesmo era de aguardente produzida da cana caiana, planta nobre das antigas. Costumava contar: Cana de setembro gosto não, pinga aguada sem sabor, a de novembro começa a mostrar espírito, alma, mas ainda não convence. Já as plantas de dezembro, chegam carregadas de sumo doce, prontas para festança de fim de ano. Estas sim dão bebida boa. Pois olhe e apure, nem o garapão dessa tem azedume malcheiroso daquele tanto.

Mesmo com discurso conhecedor, não provia desfeita a ninguém e se, em visita, toca-se pinga de indústria, não se fazia rogado. Bebia com gosto e ainda elogiava. Homem bom esse Vau. Inimigo não tinha, mas amigos de fato. Poucos, mas bons. Conhecidos? de manada.

Trabalhava o suficiente para tocar vida, não tinha de posse um passarinho para dar água, mas os tinha aos bandos em quintal de sua pequena tapera. Tanta árvore de fruta e sombra tinha plantado que havia pelo chão só folha a enriquecer e alimentar minhocas e caramujos. Grama ali nascia não.

Vau tinha cisma única de como seria o outro lado, como seria a volta, o morrer. Não entendia a graça nisso. Essa coisa de céu e inferno ele nem de longe acreditava, pois até o padre de cabeça lhe tinha tirado isso. Era que nem bicho-papão para moleque miúdo. Era para assustar, aprumar comportamento. O mistério era maior.

Ideia o seguia. Era só deitar a olhar estrelas e vinha a preocupação. Teria lá uma pinguinha boa para abrir apetite? Tinha que ter, ah isso tinha! Os bons e justos iam misturar com os desalmados trapaceiros, fazedores de coisa ruim? Tinha que ter um lugar apartado, senão ia ser um aranzé. O que não se desentendeu aqui ia sobrar só para a eternidade em algum canto do universo? Então era o inferno! Padre balançava cabeça num desisto.

Foi nada não. Dia desse, passando olhos em revista, leu manchete: “Cientistas descobrem que o cometa libera álcool etílico e açúcar”. Deu de interessar. Ficou sabendo que tinham descoberto um cometa que atendia por Lovejoy e que ele estava “soltando uma quantidade de álcool relativa a de 500 garrafas de vinho por segundo durante sua atividade de pico”.

Relaxou. Pronto, agora sabia até quando iria dessa para outra. Seria na passagem do alegre cometa etílico. Levantou sorrindo felicidade, bateu o chapéu na perna, olhou com gosto noite estrelada. Tomou caminho do boteco cantarolando: “Pegar carona nessa cauda de cometa…”