sexta-feira, abril 1

Angústia





Angústia plena

 

“Nunca viram ninguém triste?
Por que não me deixam em paz?
As guerras são tão tristes,
E não tem nada demais!”

Cazuza

 

Tanta coisa acontecendo e eu passando por fase louca, sem conseguir alinhar pensamento. Não vou falar de desgoverno, nem de politização de vacina contra a Covid, que aliás, como passe de mágica, quase some dos noticiários. Liberou geral e máscara não é mais necessária. Podem aglomerar! Gritam a plenos pulmões muitos tontos. Negacionismo me embrulha o estomago. Discuti à exaustão, perdi esperança. Cada um cada um e o coletivo perdeu espaço. Mas eu continuo firme com minha máscara e já aguardando uma quarta dose de esperança.

Quando acho que as tristezas estão consolidadas e que o mundo de Panglós é assim mesmo, me vem a máxima: “nada pode estar tão ruim que não possa piorar”. Pode, descubro em terror e sofrimento de alma. Um outro déspota, do lado de lá do mundo, em cirílico, e por pura gana de poder expansionista invade a Ucrânia. Não sou bom em política internacional. Por essas e outras, não adianta argumentar que o real motivo seria o avanço da OTAN para muito perto de Moscou, colocando em risco a soberania Russa. A Criméia foi anexada, ótima palavra para não dizer invadida, pela “simples” alegação de que Kiev iria “proibir” o uso da língua russa. Guerra a pleno vapor e o povo ucraniano em sofrimento. Agora alegam que a Ucrânia tem armas químicas e que pretendem usá-las. Você já ouviu uma história parecida contra um admirador do rei Nabucodonosor, que acabou enforcado e, mesmo assim, não se descobriu nada de armas químicas?

Vejo, estarrecido, bombas despencando como chuva grossa sobre as cabeças de inocentes. Corpos de crianças frias de vida deitadas em chão de neve. Choro em profunda tristeza.

Acostumado que estou em relatar um cotidiano morno de minhas andanças de interior matuto sempre com oi olhar ao que me cerca, não poderia me furtar ao silêncio frente a tamanha barbárie que vem se juntar às tragédias domésticas, a mil guerras internas travadas diuturnamente bem mais perto de nós e, quase sempre, ignoradas por maioria. Crimes sem castigo, para lembrar de maneira torta, mas não por acaso, o sublime escritor russo Dostoiévski. Quantos Raskólnikovs aqui e mundo afora tentando provar alguma superioridade estúpida! Só que agora os assassinatos não são a machado, são de uma pirotecnia maléfica e de alta precisão em misseis balísticos, a mirar escolas e hospitais. Ouvi outro dia a expressão “guerra ao vivo”. E é exatamente isso que todos os canais de comunicação nos mostram. Assistimos almoçando ou jantando como se tudo fosse normal. Passe para mim o arroz...

Perdemos o poder de nos indignar realmente? Em que estamos nos transformando? Será processo darwiniano ao contrário?

Falo com nó na garganta e profunda indignação, falo em oração ao D’us de cada um. Perdemos PERMANENTEMENTE o jeito para o amor e solidariedade?

Não quero me perder em total desesperança. Assim, recorro ao dramaturgo francês Jean Giraudoux para, literalmente, não perder de vez a sanidade que me é tão cara: Uma vez declarada a guerra, é impossível deter os poetas. A rima ainda é o melhor tambor.”

 

 




Diário de Uberlândia em 1º de abril 2022