Tem aos montes em casa, seu canto parece uma risada. Aqui tratamos por carijózinho, além de Choca-borrada, também é conhecida por maria-cocá e gata-véia. Nome científico é Thamnophilus doliatus
Fêmea
Macho
Fonte: Aves no quintal
"Se for falar mal de mim me chame, sei coisas horríveis a meu respeito" (Clarice Lispector)
segunda-feira, dezembro 31
sexta-feira, dezembro 28
quarta-feira, dezembro 26
Procissão
Longa e silenciosa procissão. Em silêncio oratório seguem com seus coloridos estandartes escarlates, outros tantos de vivo amarelo marcavam cordão a um canto da imensa fila. Alguns empunhavam o que parecia ser bastões. A formação militar espantava. Organizados e objetivos abriam caminho pelo asfalto quente como se este não os incomodasse em nada, tamanha a concentração e objetividade.
À distância segura acompanhei penitente aquele desfile. Não porque me sentisse ameaçado ou coisa parecida, pelo menos de imediato mal fazer não parecia estar nos planos deles. Não queria interferir e menos ainda ser responsável por algum desacerto naquele penitente caminhar. Olhar me bastava. A rigidez de comportamento assustava. Não havia perdão, misericórdia para com aquele, qualquer lá fosse o motivo; exaustão, distraimento, tropeçasse ou deixassem cair por terra seu estandarte. Passavam por cima, pisoteavam. Parecia que o indivíduo isolado nada representava, o todo sim era importante, o serpenteado movimento daquelas imensas filas, ao botar mais atenção notava-se nitidamente que eram duas, uma ladeando a outra, mas em movimentos militarmente sincronizados, como se ligação visceral entre ambas existisse. Aquele deslocamento sincrônico era mágico e vivo por inteiro.
Longa e dupla fila virava esquinas, imensos quarteirões, gigantesca multidão. Nem o menor barulho se fazia ouvir. O pisar, apesar de ligeiro, era leve e calculado, objetivo não era chamar atenção. Acostumada a vista à observação, notava-se ao largo, em vários pontos outros empunhando imensas bandeiras como velas de jangadas ao sabor de um mar pouco amigável. O vento as fustigava sem piedade e não raro as fazia tombar. Rápidas, como que receosas de repreenda, aprumavam e deslizantes seguiam caminho.
Lembrou cortejo preparando colorido tapete como os de Ouro Preto e santa sexta-feira. Cantarolei baixinho Milton: “Velejar, velejei/No mar do Senhor/Lá eu vi a fé e a paixão/Lá eu vi a agonia da barca dos homens”…
Quietude e prece.
A falta de tolerância com os tropeços alheios tirou a fé de questão. Troupe guerreira em busca de novas conquistas – assim as vi por minutos.
O avanço era descomunal, o amarelo e vermelho pintavam o asfalto. Aquarela em permanente movimento. Acácias e flamboyant aos poucos esquartejados seguiam para preparo de banquete. Haveria festa e dança para os vencedores?
A frase “ou o Brasil acaba com a Saúva ou a Saúva acaba com o Brasil” demonstrou mais uma vez ser descabida. Muito antes das cidades de ouro dos nossos índios, dos estes sim invasores portugueses; muito antes das capitanias hereditárias e de gritos de uma independência que nunca chega que elas aqui estão. Cumprem sim dever cívico de manter o que resta de nossas terras férteis e adubadas. Prejuízo? Não, chamo de desforra.
Se pragas são, então aqui estão duas a conviver em harmônica inimizade. Homem e saúva. A saúva não acabou com o Brasil, nós humanos, todos os dias, aos poucos, mas metodicamente, nos esforçamos ao máximo para cumprir o papel creditado às pequenas formigas. E, se o objetivo é esse, fiquem (in)tranquilos . Estamos conseguindo. Vorazes gente-saúva, insensíveis a pisotear sem piedade qualquer que cruzar nosso caminho. Egoísmo.
Sem acácias, flamboyant ou cores. Não haverá festa de fartura coletiva.
Solidão.
Publicado no Jornal Correio em 26/12/2012
segunda-feira, dezembro 17
domingo, dezembro 9
quinta-feira, dezembro 6
domingo, dezembro 2
Progresso?
Eu aqui no quintal em meio a um silêncio de feriado. O sossego aqui é normal, pois nossa rua liga nada a lugar nenhum e por ela só passa quem mora, visita ou está perdido, mas em dias de semana sempre tem uma conversa ao longe, uma famigerada makita ou betoneira fazendo algum conserto, já contei a implicância que tenho desses barulhos. Me trazem péssimas lembranças. Leio aqui no CORREIO que haverá mudança no zoneamento do uso e ocupação do solo pra os nossos lados.
Leio também que alguns moradores estão felicíssimos com as modificações, pois tais alterações “valorizarão” seus imóveis. Quanta pobreza de espírito. Trocam a paz de seus lares por alguns dinares. O bom é ter carro novo financiado em 60 meses, morar no fim do mundo e depois reclamar em programas de televisão e rádio que pautam tragédias que os serviços públicos ainda não chegaram à rua de terra onde conseguiu comprar casa. Reivindicam unidade de saúde, asfalto para ontem, escola, creche, posto policial, pois o tráfego de drogas manda e desmanda na região. E a culpa será de quem? Claro, do prefeito em exercício, obviamente.
E aqueles mesmos vereadores que decretaram as mudanças nos bairros de origem dessa gente aparecerão como moscas em carniça para tirar algum proveito político da miséria alheia, lançar sobre aqueles que diretamente traçaram o destino seus cabrestos e prometer mundos e fundos em troca de votos. E de novo, conto do vigário.
Descrença com os políticos que, a seu bel-prazer, mudam leis sem consultar os principais envolvidos. E eu que pensei que tudo estava restrito a uma lei estúpida que mudava as características apenas da rua da Paz ali na Morada da Colina.
Logo muitos não terão mais vista para a cidade, perderão o sol do amanhecer e sua suave brisa.
Os problemas não tardarão a aparecer. Imagine você uma face de quarteirão projetada para, por exemplo, dez casas. As redes de esgoto, a largura das ruas, dos passeios é dimensionada para aquele número de imóveis.
Rufem os tambores, soltem fogos de artifícios. Do nada, como passe de mágica, surgem gigantes edifícios de dezenas de andares, condomínios verticais aparecem como que plantados como os feijões mágicos de João e alcançam as nuvens. É o tal progresso a qualquer preço. As ruas não comportarão mais tantos carros e estacionar será um problema e, para piorar, é bom lembrar que cada módulo residencial terá em sua maioria mais de um carro. As ruas ficarão obstruídas e o movimento, o barulho transformarão a vida de quem por ali nasceu, viveu quando ainda existia quietação em um inferno. Pardais e pombas europeias dominarão os beirais. Não haverá mais canto de passarinho.
Sustentabilidade e qualidade de vida? Papo de bicho-grilo. Outro dia recomendaram a um especial amigo que, se não estava satisfeito, fosse morar em um condomínio fechado. Desaforo incomentável. Na verdade, não era nada disso que eu queria falar quando comecei no quintal a ouvir o silêncio profundamente reconfortante de um feriado. Queria mesmo é compartilhar o canto de mil passarinhos, o cheiro de churrasco que aqui me chega e a delicada voz de Billie Hollyday no vinil.
Mas não consigo deixar de imaginar a cena dantesca que poderá ocorrer se, em algum momento naquele cenário descrito, todos resolverem dar descarga ao mesmo tempo. Canos de 50 para vazão de 200. Vai dar caca.
William H. Stutz
Veterinário Sanitarista
whstutz@gmail.com
E aqueles mesmos vereadores que decretaram as mudanças nos bairros de origem dessa gente aparecerão como moscas em carniça para tirar algum proveito político da miséria alheia, lançar sobre aqueles que diretamente traçaram o destino seus cabrestos e prometer mundos e fundos em troca de votos. E de novo, conto do vigário.
Descrença com os políticos que, a seu bel-prazer, mudam leis sem consultar os principais envolvidos. E eu que pensei que tudo estava restrito a uma lei estúpida que mudava as características apenas da rua da Paz ali na Morada da Colina.
Logo muitos não terão mais vista para a cidade, perderão o sol do amanhecer e sua suave brisa.
Os problemas não tardarão a aparecer. Imagine você uma face de quarteirão projetada para, por exemplo, dez casas. As redes de esgoto, a largura das ruas, dos passeios é dimensionada para aquele número de imóveis.
Rufem os tambores, soltem fogos de artifícios. Do nada, como passe de mágica, surgem gigantes edifícios de dezenas de andares, condomínios verticais aparecem como que plantados como os feijões mágicos de João e alcançam as nuvens. É o tal progresso a qualquer preço. As ruas não comportarão mais tantos carros e estacionar será um problema e, para piorar, é bom lembrar que cada módulo residencial terá em sua maioria mais de um carro. As ruas ficarão obstruídas e o movimento, o barulho transformarão a vida de quem por ali nasceu, viveu quando ainda existia quietação em um inferno. Pardais e pombas europeias dominarão os beirais. Não haverá mais canto de passarinho.
Sustentabilidade e qualidade de vida? Papo de bicho-grilo. Outro dia recomendaram a um especial amigo que, se não estava satisfeito, fosse morar em um condomínio fechado. Desaforo incomentável. Na verdade, não era nada disso que eu queria falar quando comecei no quintal a ouvir o silêncio profundamente reconfortante de um feriado. Queria mesmo é compartilhar o canto de mil passarinhos, o cheiro de churrasco que aqui me chega e a delicada voz de Billie Hollyday no vinil.
Mas não consigo deixar de imaginar a cena dantesca que poderá ocorrer se, em algum momento naquele cenário descrito, todos resolverem dar descarga ao mesmo tempo. Canos de 50 para vazão de 200. Vai dar caca.
William H. Stutz
Veterinário Sanitarista
whstutz@gmail.com
Publicado no Jornal Correio em 1º de dezembro 2012 em Ponto de Vista
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