Às vezes, somos apresentados ao óbvio para nos convencermos de que nem tudo está perdido, pelo menos em nossas cabeças e convicções.
Outro dia, a professora Ludmila Sandoval, em lúcido comentário, aqui mesmo no CORREIO, expressou o que acredito ser o sentimento coletivo. Ela nos conta que “o Ministério Público, baseado nos códigos de posturas municipal e federal recomendou que os bares de Uberlândia disponibilizem espaço de 1m75 livre de mesas e cadeiras nas calçadas, para passagem de pedestres”. E ainda: “Calçada não é extensão de bar, nem lugar para mesas e cadeiras.” E não é mesmo. Aquela cadeira onde podemos preguiçosamente esticar as pernas e trocar dedo de prosa com vizinhos pode: sinal de cidade tranquila, será? Ah! e me mostra uma calçada com mais de 1m75 aqui em Uberlândia!
Invasão de área pública é antiga e não é desprivilégio apenas de Uberlândia. Lembro bem de antigo bar na Rio Branco que todos frequentávamos à época (põe tempo nisso), no qual lá estavam as mesas na calçada. E olha que o bar era constantemente frequentado por servidores públicos, inclusive da Divisão de Posturas. Não é que faziam vista grossa, nada disso. Aquilo era considerado comum, normal. Portanto, legal, pelo menos aos olhos do clamor geral.
Ninguém nunca reclamava, desviava e pronto. Felizmente, os tempos são outros. Pessoas passam a conhecer seus direitos, questionam mais e querem respostas. Saudável é aquele que, além de saúde, detém informação.
Em cidades litorâneas, em muitos casos, foi necessária ação rigorosa do poder público para disciplinar barracas e bares. Em Salvador, a medida chegou ao extremo com derrubada dos quiosques invasores que teimaram em não se adequar às novas normas. Em Natal, Fortaleza e Maceió também houve intervenção pública. Mas sabe-se bem que as faixas de areia de praia são infinitamente maiores do que nossas calçadas. São Luís que não me deixa mentir.
Já aqui para nossas bandas parece que as cidades foram programadas para carros, não para gente. As já estreitas calçadas não poderiam, em hipótese alguma, permitir que áreas ditas públicas fossem tomadas por comércios de qualquer espécie. Temos bares que funcionam há anos em áreas públicas imensas, obstruindo o ir e vir das gentes, dificultando o livre direito de transitar por elas. Se for portador de necessidade especial, nem se fala.
O perigo de tragédia anunciada, descrita pela esclarecida professora, é apenas uma das facetas deste descalabro que se tornou um fenômeno cultural aqui.
Calçada é para caminhar. Não é lugar de mesa, cadeira, painel de propaganda, nem banca de venda de seja lá o que for. Queremos educação no trânsito, concorda? Pois nós, pedestres, estamos mais do que incluídos nessa confusão urbana. Portanto, para não invadir espaço de bólidos ameaçadores, criadores de tristes estatísticas, temos obrigação de atravessar sobre faixa de pedestre e direito de uma calçada livre de empachamentos. Mas não apenas.
Conhecemos bem a conservação da parte que nos cabe. Em muitos pontos parecem trilhas com obstáculos intransponíveis até para atletas experientes em “trekking”. Medalhista aquele que, em casa, chega sem torção ou queda. Antigo problema merecedor de solução imediata. Fim de mesas e outros obstáculos, e calçadas conservadas. Aí, sim, uma cidade educadora para cidadãos educados.
Publicado Jornal Correio em 17/11/2013
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