Era uma vez uma linda e serelepe margarida. Leve e solta vivia a cantar e a escrever lindos e doces poemas. Adorava se deixar ao vento, onde suas pétalas coloridas eram por ele acariciadas. Ali, com as gotas de orvalho, se banhava em versos e seu bom dia era como uma prece, onde agradecia a beleza da vida. Cada dia vestia uma cor. Ora branca, ora amarela ou um reluzente laranja. As cores vinham de seus pensamentos, de seus sonhos e, transparente que era, se deixava assim enfeitar.
Um sorriso lindo a deixava mais e mais bonita. Seu sonho sempre foi vestir chita e correr vereda, acompanhada de borboletas formosas, abelhas com seu perfume de mel e beija-flores em bater de asas, abrindo caminho entre o dourado capim fresco da manhã. Mesmo impedida, não se sentia triste, pois todos os seu lindos sonhos a conduziam por este caminho de formosura e ela, com seu vestido de chita rodopiava feliz.
Era a margarida mais bonita entre tantas, e sua inimaginável beleza não vinha apenas de suas cores, de seu pólen mágico de Pirlimpimpim. Possuía uma energia inesgotável de bem fazer, de alegrar crianças, velhos e gentes que passavam por seu caminho. Em meio a tantas, se destacava, sua energia podia ser sentida de um longe ver. As noites eram de muita prosa e cantar, as estrelas brilhavam enciumadas: como pode uma simples Margarida brilhar mais do que nós? Perguntavam amuadas.
Seus amigos vaga-lumes formavam colares e em seu entorno, como enfeites de Natal, pequenas aranhas teciam toda noite seu vestido de chita com a mais pura seda que eram capazes de produzir. Ali a lua em seu nova/cheia se deixava ficar a escutar a cristalina voz da Margarida que também se punha a contar histórias de lonjuras, de mistérios de amores perdidos.
Um belo dia a Margarida conheceu um rude, triste, confuso e mal-humorado espécie de flor. Não tinha cor nem brilho, suas poucas pétalas pareciam queimadas por frio intenso de geada, chamuscadas de alguma queimada.
Sem perfume, quase sem vida, o tal suspirava abafado e compulsivamente. Tinha muitos espinhos, com caule áspero e seco.
Incomodada com tamanha melancolia, a mágica Margarida tentou um ligeiro aproximar. Estendeu gentil folhinha do mais puro verde, quase tristeza em forma de planta.
Para seu espanto, recebeu em troca um cálido sorriso e um afastar ligeiro.
Quis saber o motivo de tamanha amargura. Soube assim:
Fora belo sem ser narciso, feliz um dia. Não, muitos dias. Vivia com outra flor de fortes cores e perfumes deslumbrantes e pensava que o simples gostar, o amor de seu jeito seriam suficientes. Era rude e mal-humorado quase sempre. Vivia a buscar o que sempre teve e nunca percebeu. Não regou, não cuidou como deveria. Assim, merecidamente, perdeu seu então bem mais precioso, por puro não saber zelar.
A tristeza agora vinha do luto do naufrágio em tempestade por ele mesmo criado. Não haveria colheita futura.
A margarida condoída lhe ofereceu seu coração, suas cores, seu sorriso, suas canções.
Em impulso e sem saber bem se entregou a ela. Viveram intensa paixão e encanto. Suas folhas ganharam brilho novamente, o sol a brilhar o aquecia em carinho.
Precipitou, no pensar de amar poder outra vez.
Não era hora nem destino, pois o peso da perda ainda batia forte. Novamente em defesa, não querendo sofrer, se possível assim fosse, outra vez rude e amargo se tornou.
Assim, perdeu para sempre a bela Margarida. Novamente não soube cuidar. A felicidade lhe escorreu entre os dedos mais uma vez.
O tempo, professor em voo constante lhe ensinou.
Não sofre mais por passado, sorri sozinho tamanha tristeza sentida, livre para sempre, sem amarras, sem poita.
Hoje de penosa flor a caprichoso jardineiro pronto a zelar com carinho de sua planta.
Para as flores que um dia magoou só resta pedir desculpas por tanto sofrer. Nada será como antes, mas a primavera sempre trará flores, perfumes, amores, refúgio.
Assim Margarida seu dito muito me serve:
“Se Margaridas florescerem na sua rua e isso lhe trouxer saudades minhas, a culpa é sua…”
Saudade e culpa, sem remédio, sem cura?
Publicado em Voz Ativa - Ouro Preto
Em 24/02/2018
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