domingo, maio 24

Inflação e fumaça

Deu no CORREIO de 14/5: "Cigarro e remédio geram inflação"
Para mim um contra-senso .
Vamos analisar de maneira bem simplista: se o cara fuma provavelmente vai adoecer mais e, conseqüentemente, ingerir mais remédios, fechando assim a roda da vida, ou mais corretamente, a roda da morte. Mas vamos e convenhamos, qual o reflexo real do vício de outro nas taxas que influenciarão na minha, na sua, na nossa monástica e equilibrada vida?

É verdade: a cervejinha do fim de semana é sagrada, mas, como poderão notar lendo a matéria, não entrou no balaio de “artigos” pesquisados.
Portanto, nada de incriminar nosso raro e esporádico exercício de socialização. Se dirigir não beba, se beber me chama. Cada qual com a sua moderação.

Particularmente acho que cigarro não deveria contribuir para o cálculo do Índice de Preços ao Consumidor. Não faz sentido um vício compor a lista de itens pesquisados para determinar esse famigerado desequilíbrio econômico. Isso, sob a ótica de um veterinário leigo absoluto em economia, a não ser naquela que ele e família tem que fazer para sobreviver ao mês, abelhudo o suficiente para perguntar o que muitos se devem estar perguntado, talvez sem coragem de demonstrar sua ignorância em assuntos financeiros.

Nada, garanto, de querer criar acirrado debate acadêmico, pois nem de longe conseguira sustentá-lo, não é mesmo minha praia. Estou mais para geração Woodstock do que Yuppie, graças ao bom Deus.

Cesta básica, aluguel, tarifas de energia e lazer e, pasme, lazer! Remédios não têm como deixar de fora, nosso povo, por motivos muitos, adoece demais. Ainda segundo os especialistas, o açúcar ajudou a temperar a inflação do período, ficou mais salgada. Pelo andar da carruagem daqui a pouco entrarão na lista de itens pesquisados CDs, DVDs e fitas K7 piratas. Putz! Fita K7 só não é mais antiga do que radiola e máquina de escrever.

Atentos estudiosos passarão a computar custos do trabalho de guias de bala perdida, taxa de flanelinha tomador de conta de vaga no centro, mensalidade da milícia do bairro, aumento da aposta no jogo de bicho. Seria a absurda institucionalização dos ilícitos. Tempos atrás eu fumava, mas, graças à ajuda dos filhos, parei de vez e não me lembro mais do gosto da fumaça. Se ainda fizesse uso do tabaco, hoje mais do que nunca, ia me sentir culpado pelo mal coletivo que estaria causando ao bolso das gentes. Desta eu escapei, pois o fumante no mundo já está sendo considerado um cidadão perigoso, capaz de detonar o pulmão dos puros, dos castos em vícios permitidos.

Agora, para piorar, chegou ao fim do poço — ou do cinzeiro. O cigarro, além de queimar a imagem do usuário como bituca em boca de malandro, virou também, nesse momento, símbolo de agressão ao custo de vida. Pensando bem, essa história tem lá suas vantagens. Não seria oportuno o momento de entrar em uma profunda crise de cidadania e mandar o cigarro às favas e parar de fumar de vez? Um bem coletivo e principalmente individual. E não é que inflação serve para alguma coisa! Por outro lado desta feita a culpa do avanço inflacionário não foi atribuída ao chuchu, à batata, à cebola, ao milho ou à carne. O produtor rural, que de sol a sol se mata de trabalho, fumante ou não, de coração agradece. Desta vez a roça não é o monstro da história.





Jornal Correio 24/05/2009

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