Com grandes ressalvas ouço e leio sobre o gigantesco investimento de R$ 2,4 bi, com vistas a concretizar a produção sucroalcooleira em nossa região. Se por um lado a geração de milhares de empregos diretos e indiretos é notícia alvissareira – é esperar para ver – por outro fico mais uma vez preocupado com nosso escamoteado meio ambiente. Posso parecer um ecochato, não sou. Com propriedade disse Guto Requena em artigo publicado recentemente na “Folha de S. Paulo”: “Para ser moderno e descolado, hoje, é preciso ter uma mesa com selo verde, uma almofadinha feita de PET reciclado ou uma bolsa com tampinhas de refrigerante, tudo ao estilo “hippie-chique”.
E continua “Ao contrário: o ato de consumo sem necessidade já é, a priori, insustentável”.
Não, nada disso. Prefiro me sentir apenas como alguém simplesmente consciente, preocupado com o futuro, nada mais.
Está certo, concordo que “o biocombustível vem sendo encarado como um dos métodos preferenciais de reduzir as emissões de gases responsáveis pelo efeito estufa, geradas pela queima de combustíveis fósseis, e assim reduzir o aquecimento global causado pelas atividades humanas”. (Kelly Hearn na National Geographic News e isso dito em 2007).
A expansão da produção agrícola em larga escala a fim de cultivar mais cana, dizem os críticos, agravará a perda de diversidade de espécies, as questões de qualidade da água e a fragmentação de habitats em algumas das regiões mais diversificadas biologicamente em todo o mundo. “A preocupação primária é que o esforço de produção de biocombustíveis amplie direta ou indiretamente as perdas nas áreas de alta diversidade biológica remanescentes no Brasil, tais como o Cerrado”, diz John Buchanan, diretor sênior da Conservation International, uma organização norte-americana sem fins lucrativos. A região do Cerrado, “com 1,9 milhão de quilômetros, representa a maior savana da América do Sul e uma das mais ricas do mundo em termos de espécies de pássaros, répteis, peixes e insetos”, completa Hearn.
Nosso Cerrado, antes da expansão agrícola que, com técnicas apropriadas conseguiu tornar-se farto em produção, ia muito bem obrigado. Rico em vida e saúde.
Terras antes consideradas impróprias economicamente hoje são negociadas a preço de ouro. Basta uma voltinha nos arredores de Uberlândia para ver o estrago irreparável causado ao nosso frágil ecossistema. Não, não precisa ser nenhum Augusto Ruschi ou um Jacques Cousteau nem militante de carteirinha do Greenpeace para perceber o enorme impacto que causamos em nosso entorno. As loucas estações do ano com suas mudanças sentidas na pele são uma pequena demonstração do nosso poder de destruição e inconsequência.
Cana só dá em terra boa. Imagine você o que será necessário para que os verdes campos sejam corrigidos para receber essa cultura exógena.
A cana-de-açúcar veio para ficar, até aí nenhuma novidade. Mas seguramente não veio para adoçar nossas vidas e muito menos a de nossas plantas e nossos bichos. O preço de tanto doce poderá, um dia, ser a causa de nossa diabetes existencial e do envenenamento irreversível do solo, onde todos nós um dia gostaríamos de descansar em paz. Não haverá insulina nem antídotos em quantidade suficiente para salvar o que ainda resta de magnífico e já condenado cerrado. Morte anunciada. A culpa? Ganância.
Publicado no Jornal Correio em 04/03/2013
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