quarta-feira, agosto 26

Politica municipal


Peço licença aos jornalistas especializados na matéria aqui do CORREIO de Uberlândia, vou dar pisada leve, daquelas de não deixar nem marcas em praia na qual cambaleio, queimo os pés em quente e movediça areia e corro para água ligeiro.

Penso hora que vi quase de tudo. Nada vi. Quando o assunto é arte da política, aí me embanano todo. Sou parlamentarista por convicção e fervoroso defensor do voto distrital; este fortalece a relação entre político e cidadão, meu voto elege ou não quem escolhi e não um pára-quedista qualquer de outro lugar do qual nunca nem ouvi falar.

Infelizmente, ando a perder em ambas as formas que realmente acredito democráticas. Pronto, é o máximo no assunto que me estendo, que consigo, me dando por satisfeito como cidadão. Nunca sei se em quem votei, anda ou não a fazer.

Uberlândia, terra da qual agora também sou filho, adotado e por decreto é fato, mas minha cidade de coração anda a me passar alguns sustos quando o assunto é política e politicagens.
Li outro dia aqui no CORREIO que querem lançar Hélio Costa como candidato a prefeito ano vem. Que maluquice é essa São Jorge – desculpe evocar seu nome em vão, Santo guerreiro, mas apenas a ti posso pedir proteção. Me vem um senhor lá de Barbacena, que não conhece nem onde fica a Morada Nova, Jardim Sucupira. E a Granja Marileusa? Saberia ele onde fica? Duvido que tenha participado sequer de uma edição da maravilhosa Corrida do Cerrado. Dirão que isso não tem a menor importância. Concordo, em parte, mas saberá ele o que é o Cerrado?

Mas e os anseios do nosso povo? Como pensa/ fala, seu sotaque gostoso? Ouço meus filhos fecharem os erres. Nem com quase quarenta anos de Uberlândia consegui perder meus erres arranhados de Belo Horizonte. Imagina o senhor Hélio Costa conversando com o nossa gente. Vai parecer programa de entrevista de televisão, com direito até ao balançar de ombros muito bem capturado nas charges de Valtênio.

Pensa que acabou aí, queridos amigos?

Além do barbacenense, mais um estranho no ninho prepara para se lançar candidato, o zero de votos e ex-suplente de senador, carioca da gema e dos “xis”, Wellington Salgado. Aliás, eu cá na minha ignorância fico a pensar na tal figura de suplente, me explica: isso serve para quê mesmo? Uma pessoa assumir um cargo da envergadura de um senador sem ter tido sequer um votinho? Nem o dele próprio! Fala sério.
Será nossa Uberlândia tão pobre de gente capaz assim? Claro que não! Temos figuras do naipe de Gilmar Machado, pronto para tentar reeleição, temos Odelmo Leão, temos três Prados, um Tenente reformado, temos Leonídio, Luiz Humberto e tantas outras lideranças aqui da terra que verdadeiramente conhecem o chão onde pisam, se não aqui nasceram fizeram vida aqui há décadas.
Falam a língua de nosso povo “como ninguém fala mais” – Saudades, Teotônio Vilela. A lei permite estas coisas, então é direito deles correrem atrás da viúva seja eles de onde forem: Erechim, Quixeramobim, São. Mas que é estranho e esquisito, lá isso é! Sarneys do Amapá!

Fico imaginando o programa eleitoral ano que vem. Que salada de sotaques estrangeiros. Prata da casa Uberlândia, prata da casa… No mais, Gerais.








Jornal Correio em 26/08/2015




Politica municipal




segunda-feira, agosto 24

Domingo no Sabiá




A mais preciosa das minhas amigas me contou aventura. Não satisfeito fui conferir. Tristemente vi, ouvi e senti o motivo de sua chateação.
Domingo tem cheiro de domingo. Parece lógico, mas não é. Conhece por acaso o cheiro de uma segunda-feira, de uma terça?
Os cheiros perfumados começam geralmente nas quintas-feiras, na sexta são mais ainda perceptíveis, explodem em coloridos no sábado e se fixam mansos aos domingos.

Portanto, domingo tem perfume delicado e prazeroso. Esse, em particular, emanava em brisas perfume “floral aquático”, idênticos à criação do mágico perfumista Harry Fremont, aliás, a descrição acima pertence a uma de suas obras primas: O Oui! De Lancôme.
Este era o aroma daquele domingo: Oui! Acordei cedo como de costume. Janela sempre aberta, claridade suave, cantos de milhões de pássaros e tagarelar de maritacas entraram cedo no quarto. Mais realista do que o rei tomo banho para dormir e ao acordar, racionamento que me perdoe, mas esta, juro, é minha única extravagância de consumo. Atualmente tenho apenas um pequeno cacto para cuidar e um jardim minúsculo, portanto, água fica sempre na taxa mínima.

Seguindo plano feito antes de dormir, resolvi correr no Parque do Sabiá e não nos bairros, como faço quatro vezes por semana. Adoro aquele parque, o lugar, as pessoas. Ilha de um verde diferente dentro de uma cidade que parece odiar árvores.

Decidido a dar três saborosas voltas, saío manso, trote leve, aquecendo. Incontáveis bons-dias e acenos de mão muita gente conhecida. Fiz caminho anti-horário. Pouco depois da descida do canil da Polícia Militar, começando a subida para chegar ao zoológico – única parte de lá que detesto – sou adepto do fim de todos os zoos do mundo – me deparo com o motivo da tristeza e revolta de minha especial amiga.

Um dragão mecânico em rugido insuportável, soltando fumaça de óleo diesel no rosto daqueles que ali vão em busca de ar puro e saúde. Além disso, levantando poeira para todos os lados em total falta de harmonia com um dia de paz e lazer. Um funcionário do parque carregava este monstro às costas: um desnecessário espalhador de folha e poeira a vociferar e cuspir de um lado para outro. Aliás, é exatamente o que este equipamento faz. Parente mecânico dos espanadores domésticos, só serve mesmo para mudar as folhas de lugar. Tudo bem que os usem, mas em pleno sábado e domingo? Muita falta de poesia, de sensibilidade. Folha não é lixo, não é sujeira. Deixe-as lá. Não fazem mal a ninguém e o barulho do nelas pisar é parte do sair urbano. Fumaça e poeira em área onde até fumar poderá (e deve) ser proibido quebram toda a beleza estética de nosso lindo parque. Que sabiá ou outro passarinho vai competir com aquele motor poluidor e inútil em limpeza?

Fica aqui um pedido de muitos ardorosos adoradores do Parque do Sabiá. Se acharem que aquele equipamento serve para alguma coisa, por favor, que seja usado em horários especiais, longe das gentes, longe dos bichos.
Aliás: “Você sabia que o Sabiá sabia assobiar?” – Durma-se com um barulho desses.








No Jornal Correio de 23 de agosto 2015



https://drive.google.com/file/d/0B3a7BJIdLwOhNjV5Z00wNjR4NFE/view?usp=sharing

segunda-feira, agosto 17

Sobre o nada




Diz um sábio amigo meu: “para quem não tem nada, metade é o dobro.” Confesso que fiquei muito tempo a imaginar o significado deste nada. Podia ser um nada total, um meio nada, um quase nada com ponta de algo. Hoje, por exemplo, acordei com um nada de escrever, coisa rara. Não que não tivesse vontade, mas não me vinha assunto. Fiquei parado olhando o vazio da folha em branco, hipnotizado pelo nada.

Tinha passado por uma overdose de coisas ruins a semana toda. Algumas me diziam respeito diretamente, outras, ao mundo, da porta para fora. Os noticiários pessimistas, histórias de inflação voltando, economistas nos ensinando como usar nosso rico e suado dinheirinho. O que não devemos fazer para conseguir vencer o mês. Falaram de tudo menos da tal felicidade de se sentir vivo.

Não que ache que a preocupação com finanças domésticas e pátrias não seja de suma importância. Mas nem tudo pode ser definido em cifrões e, muito menos, colocado em escalas e gráficos. Os governos mundiais, assim como as mídias, deviam achar espaço, prioritário e grande, para levar esperança e felicidade às pessoas. Mandatários e as gentes deveriam pôr fim às guerras e abolir vaidades e ambições. Vive-se com pouco. Morre-se e mata-se por menos ainda.

Pois é, cheguei até aqui como náufrago encontra ilha. De repente, uma onda de um azul-turquesa atira corpo desanimado em canto perdido, paradisíaco. Cachoeiras com águas puras e cristalinas, frutas tropicais em abundância, pássaros multicoloridos com seus cantos melodiosos. Riachos repletos de peixes saborosos. Montanhas imensas a proteger de vento sul, bichos de todas as espécies vivendo em harmonia.

Tudo perfeito. Em poucos dias, nosso náufrago se restabelece forte, corado, saciado. Estava feliz com seu, e só seu mundo aprazível. Era um bem-aventurado, nada de contas a pagar no fim do mês, nada de humanos destruindo/poluindo um mundo que longe agora estava. Nada de gritarias, altas falas, tons estridentes, lamúrias e desilusões. Pressa para não perder o capítulo da novela. Não precisa de transporte público, de emprego, de shoppings ou restaurantes.

Nada de música sertaneja, de buzinas de carros, engarrafamentos. Adeus prestações, cartões de crédito, carnê do Baú, sonho com Mega-Sena, fofocas e mentiras. Não mais ter que lidar com ciúmes ou invejas. Pressão doze por oito. Correr 20 km todo dia em praia só sua. Beber água de coco – as paroxítonas terminadas em “o” não se acentuam combinado?

Aí, em outro belo amanhecer, aparece na praia uma linda mulher. Caiu de um navio de cruzeiro, talvez embriagada de solidão. Perfeito demais, roteiro de filme de Hollywood de segunda. Passam a viver juntos e felizes. Por um tempo. Aí, chega uma @#$% de uma cobra e sussurra em seu ouvido: “Come logo essa @#$%& de maçã, pô!”

O mundo vem abaixo. Um dia, ele, em desespero, se atira no mar e dispara a nadar em direção ao sol poente. Sobem as legendas, um imenso “The End” preenche a tela. Nosso náufrago exaurido se apoia em algo vivo e ameaçador, nem se importa, pois vale o dito popular: “para quem está afogando, meu amigo, jacaré é toco.” No mais, Gerais.







Correio de Uberlândia 16 de agosto 2015




 Sobre o nada

segunda-feira, agosto 10

Saracura




Entardece manso. Saracuras cantam logo ali no brejo: três potes, três potes, três potes. Bateu um não estar e não ser. Sozinho, subi e desci escada de casa mil vezes, nada lá em cima, embaixo pouco. Sem fome ou vontade de nada, abro e fecho geladeira três, quatro cinco vezes, de lá só o ventinho frio, nem vejo o que tem dentro.

Hora de dormir que não chega. Tento televisão. Não tem uma notícia boa. Música, penso eu, adoro cantos gregorianos, me lavam alma. Não funcionou desta feita. Faço relaxamento sem nunca ter aprendido. Fico em posição bem confortável, desligo música, fecho os olhos e concentro. Quero pensar em um nada. Relaxo os músculos por partes. Dois imensos minutos se passam.

Coça o nariz, finjo que não está acontecendo. A coceira aumenta, não dá! Levo palma da mão esfrego com força. Volta a tentar meditar. Esvazio os pensamentos, os fecho em baia, pois como tropa selvagem não têm costume a prisão. Percebo em algum canto da mente uma superlotação de pensamentos. Se apertam contra a prisão que criei para eles. Rebelados, pedem ajuda, peço calma por alguns minutos. Vai dar confusão pensar sem pensar.

Agora coça a cabeça, o cabelo. Será por isso que os monges são carecas, penso cá com minha solidão? Não deve ser esse o motivo, pois se cabelo não vão ter para coçar imagina o estrago que faria um mosquito ali pousando no ápice de profunda contemplação mental. Tranco mais estes pensamentos em masmorra.

Beleza, consigo soltar os ombros, antevejo a porta para entrar em alfa. Opa, estou no caminho certo. Certo, né!? O telefone fixo toca. Mas não é possível! Atendo sem paciência. Uma gravação pergunta se sou fulano de tal, se for aperte um se não for aperte dois. Tá certo que aperto o dois, bato o telefone com certa força no suporte. Tem base? Agora até cobrança é feita por gravação.

Meu telefone deve ter pertencido a vários estelionatários ou maus pagadores. Todo dia, uma pessoa com um sotaque diferente liga procurando alguém. Para oferecer doce de leite ou prêmio de rifa é que não é. E o pior é que este número é recente, adquiri há poucos meses, poucos o sabem meu. Volta a posição para relaxar. Quase perto de cochilo, a almofada começa a escorregar lentamente. Abro um olho, a coisinha continua escorregando manso. Aprumo. Definitivamente não vou conseguir nada hoje.

Volto à geladeira. Penso em dar uma corrida boa mas meu joelho está pedindo folga a ponto de me fazer perder a bela corrida de revezamento Uberlândia-Romaria. Abro a porta da prisão dos pensamentos, eles chegam como pororoca e se espalham misturados na praia de meu estar. Como quebra-cabeça ou bibliotecário, vou colocando cada um deles em sua devida prateleira, alguns ariscos, tentam me escapar. Passo peia, laço outro longe a se perder. O melhor é deixar passar, respirar fundo, mergulhar em sono repleto de sonhos. Amanhã, tudo estará novamente no lugar.

E as saracuras, agora, em maior número engrossam coro melancólico e, pelo que sei, partem para festa no céu, quebrei três potes, três potes, três potes, com um coco só, um coco só, um coco só.









Jornal Correio em 09 de agosto 2015



segunda-feira, agosto 3

Cantada




Adoro rádio. Nada melhor para dormir do que um rádio à válvula, daqueles que custam a esquentar e ficam zumbido em estática o tempo todo. Ganhei um assim do grande amigo Júlio Penna. Este, sim, entende de rádio, tem dezenas. Fuça, busca peça, conserta, ajeita e os deixa prontos para quem gosta de viajar nas ondas longas, médias, curtas e frequência modulada. O presente apresentou um pequeno problema ao regular volume e ele o levou para arrumar.

Alguns preferem som remasterizado, livre de ruídos e outros atrapalhos. Particularmente, os tais atrapalhos é que me fascinam.

Ouvir uma Nina Simone em um ensaio em plena Nova York e, ao fundo, ouve-se o telefone tocar, carros buzinam lá fora. Quem ligou em pleno ensaio? Algum diretor de teatro da Broadway? Um restaurante na 150 West 57th Street? O Russian Tea Room, por exemplo, confirmando reservas? Ou simples nightclub onde ela poderia soltar a voz e beber em paz? E as buzinas, qual a marca dos carro? Um tradicional Ford preto? Um Oldsmobile imponente? E a causa de tanta aflição? Mulher em trabalho de parto, alguém ferido a bala por algum gangster? Ou simples impaciência com um trânsito já caótico da Grande Maçã nos distantes anos 30 do século passado?

Tudo isso e muito mais se pode criar com a cabeça no travesseiro, ouvindo rádios e suas estáticas. São viagens infinitas a cada mexida no seletor de estação.

Antes de ganhar joia rara de Júlio, comprei um rádio moderninho. Não queria aqueles que tocam CD, queria um rádio e pronto. Na pressa, levei para casa o bicho.

Para meu espanto, o danado só toca rádio FM, nem AM tem. Uma tristeza. Tive que me conter com o danado.
Achar estação do agrado à noite é que era complicado. Ou era rádio de igreja exaltando pecados e castigos aos quatro ventos ou era música sertaneja universitária – vai ser chato pra lá. Bom, vai ver que o chato eu sou. Nada de noticiários, nada de preamar, aviso aos navegantes, nada dito em voz suave de locutor tipo Eldorado de São Paulo – “Artes e entretenimento” seu lema. Saudades do “Varig é dona da noite” ou de “Um instrumento dentro da noite”, aqui não pega.

Resignado, me deixei levar, colocando atenção às letras das músicas e se conseguiria me soltar em pensamentos. Dou exemplo de duas estações, sem citar nomes para não magoar ninguém, que tocavam músicas com letras que poderiam parecer cantadas a uma linda mulher. Uma de muito bom gosto tocava um gentil Caetano: “Fonte de mel/ Nos olhos de gueixa/ Kabuki, máscara/ Choque entre o azul/ E o cacho de acácias/ Luz das acácias/ Você é mãe do sol (…) Você é linda/ Mais que demais/ Você é linda sim/ Onda do mar do amor/ Que bateu em mim” e seguia. Outra estação tocava algo assim: “É bonita/ Você sabe que é bonita/ Mas eu sei que é bandida (…) Você com essa cara de santa/ Mas a falsidade é tanta/ Só eu mesmo sei dizer (…)”

Não sabia se ria ou chorava. Me conte você, moça, mas com sinceridade, qual das duas cantadas você gostaria de receber?

Júlio, querido amigo, que falta está fazendo o velho e bom Vintage Crosley anos 50…








Jornal Correi em 2 de agosto de 2015



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