segunda-feira, agosto 22

Cidadão







Um bom dia de coração para todas as gentes do bem. Pois vejam queridos, ganhei identidade virei feliz, homem do cerrado. Terra que me abraçou como cria.
Engrossei couro, curti pele sob o sol mais bonito das paragens.
Meu peito em alegria pula dança de aleluias, revoada de tanajuras, maritacas, bicos-de-lacre, andorinhas da patagônia, migratórias como eu. Elas se vão eu, guardei pouso, fiquei
Posso assim agora responder firme: De onde seo moço? Por onde?
Uberlândia digo altivo olhar fincado em quem perguntou. O erre sai raspado como da origem, ligo não, Uberrrlândia, lá/ali na ponta das Minas, aqui bem dentro do peito. Alma acalmada por naturalidade possuir. Os filhos fazem as vezes do cantar a palavra nascidos/criados. De papel passado Uberlândia

Cá cheguei manso, não de paz de medo. Um novo grande por demais. Um vasto sem serras que me mostravam distâncias. Olhava, não via fim. O céu encostava em um lá longe, como mar fosse. Estranhamento.
A seca de secar com vontade, a temporada maravilhosa das chuvas, o renascer a olhos vistos. Descobri lento alguns de seus segredos. Outros ficarão para sempre em baús, caixas guardadas.
O sol nascia do pasto, olhar reto. Depois a lua. Não tem igual em grandeza e clarão-ouro. Outro vazio no começar. As gentes. Distantes desconfiadas, não era filho de ninguém, carregava sobre nome difícil, estrangeiro.
Morar em pensão, conhecer devagar o jeito daquele que tinha, sem maldade porém seco no começar. Conquistas
Tempo se vez marca. Conheci afinal as cozinhas e quintais. Vi o escondido, reservado para poucos. O jeito mineiro de ser dessa Minas que ainda não era minha. Portas e sorrisos se abrindo. Ganhei a confiança. Passei pra dentro.
Apaixonei, casei, descasei, nunca desapaixonei/desamorei, sentimento fraterno/eterno. Filhos lindos, da terra nova nascidos. Raiz profunda criada, A bruteza bela do cerrado. Me tornei pequizeiro, barbatimão, Buriti, Mangaba, mutamba, jatobá. Me tornei munguba, ipê de todas as cores, a aroeira - aqui não pica-pau. Posso peroba-do-campo, timbó sem veneno.

Me colori em penas e pelos me tornei um deles: onça, ema, sagui cobras cascavel, jiboia e jararaca.Solitário com lobo-guará, cachorro-do-mato, arredio que nem Bandeira.Me vejo tucano-rei, urubu-rei, perdiz. A arara-canindé, pato do mato, canarinho-da-terra.

Banhei em cachoeiras onde ninguém vê serra, parecendo brotar do chão. Aprendi vastidão. Saí de casulo apertado de maravilhosas montanhas, conheci chance de ter duas moradas. Dois sotaques, dois jeitos. Me tornei mais livre, de Barbatimão, Capim Gordura para fartura de Colonião, napié.
Me perfumei de tantas flores, êxtase de abelha jatái

O céu mais lindo me cobre, as noites mais iluminadas de estrelas e sons que só aqui existem. Urutau cantou em minha janela. Caburezinha em vigília, zela.

E as gentes. De tudo quanto é canto, recanto perturas/lonjuras. Um misturado de jeitos. Custa conhecer. as Minas aqui desconfiadas são, tem que ganhar confiança, provar a que veio. Se em paz para somar, logo vira de casa.
Agora com orgulho posso contar. Sou filho da terra, mãe de leite. Me deu sustento, base, referência. Meus amigos, de cá e de lá. Carrego a felicidade de não apenas me sentir, mas, mesmo por decreto, de ser agora uberlandense.






Jornal Correio em 21 de agosto de 2016

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