quinta-feira, fevereiro 19

Pé de briga

Preguiça total de carnaval. Deu rima, mas não é marchinha, é constatação. Carnaval outra vez está chegando, céus!
Tá certo, devo ser doente do pé ou ruim da cabeça. Mas que não gosto, não gosto. É isso, de carnaval quero distância. Parece até que é obrigatório gostar, nunca vi isso! Conheço pencas de
pessoas que fingem, se martirizam, pulam sem graça, dedinho pra cima, sofrimento.
Herege? Mas festa é pagã! Antipatriótico? Amor à Pátria tem a ver com essa manifestação maluca? Nem futebol tem! Bom, pelo menos não deveria ter.
Contra a cultura popular? Carnaval de hoje, repito, de hoje, tem algum vestígio, resquício cultural desse tamanhinho, capaz de ser localizado por criteriosa e meticulosa dissecação realizada por verdadeiros estudiosos de nossas manifestações, comprometidos com a verdade e não com a platéia? Aviso a aventureiros e aproveitadores sanguessugas de momentos, suas opiniões não me valem.
Duvido, é show off puro, para inglês ver e aproveitar, afinal, na maioria das vezes nós nativos somos obrigados a nos contentar em ficar à beira dos cordões, do lado de fora; sem grana para a abadá.
Careta, chato, aborrecido. Pronto ofereço alguns leves xingamentos, podem escolher um ou outro, sirvam-se à vontade. Podem até engrossar o caldo quântico, metafísico ou quiropráxico, sem remédio. Ligo não. Mas digo e repito bem devagar e espaçado: não... gosto... de... carnaval...

Tá certo, tá certo: já gostei. Carnavais na praia ou em cidade histórica. Aí a coisa muda. Carnaval de rua mesmo, onde todos participam sem frescuras, ou constrangimentos. Ninguém vigiando a roupa do outro, o jeito ou felicidade. Carnavais do SER e não do TER.
Sem desfile de modas, roupas ou falsas máscaras de querer ser o que ou quem não é. Nenhum passarinho feio posando de Pégaso, não sabendo o que era nem de onde veio,– Não é Morais Moreira? Você e Jorge Mautner sabiam fazer a festa/folia verdadeira.
Nesses locais o carnaval é o que menos importa. Apenas alegria pura, brincar, pular, ser feliz.

Hoje dá preguiça até de pensar. Pela televisão, os tais desfiles das escolas de samba acompanhados por comentaristas criando regras e padrões dão um sono só. Programa diazepínico. Quem já viu um, viu todos. Muda nadinha. O baticundum é o mesmo, as pessoas as mesmas, as críticas as mesmas. Tudo mesmo, o mesmo.
Claro que os raros flashs em carnavais de rua da Bahia, de Olinda, das manifestações ainda populares de uma ou outra Ouro Preto ou Diamantina, trazem uma saudade nostálgica e ótimas lembranças. Mas são tão rápidas aparições sufocadas por belezas pintadas à mãos depois de torturantes dias em camarins, de sorrisos congelados em rostos sem expressão, que não dá nem tempo, zap na TV.
Aí vai madrugada a dentro. Globalização geral: só tem carnaval enlatado, mais nada.

Tá certo, sou doente do pé e da cabeça, sei também o pé de briga que plantei. Mas fugir de carnaval tornou-se obsessão para mim. Não, mais do que isso, uma necessidade.

Quer desfilar? Vai pra Três Ranchos. Quer sossego? Vai para um rancho. Eu vou. Televisão desligada, um bom estoque de vídeos, bons discos, bons livros e, se possível e sobrar alguém, companhia de bons amigos.
Eu vou, e vou cantarolando antiga marchinha:
“Tomara que chova uma chuva bem fininha pra molhar a sua cama e você passar pra minha...”





Fevereiro 2009

No Jornal Correio AQUI

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