Imagem de Prefeitura de Biguaçu
E pensar que esta história começou com um grande Irmão Psiquiatra, que literalmente me tirou de rota de colisão comigo mesmo, me fez assumir novamente o manche de minha vida, me permitiu voar em céu de brigadeiro, resgatando meu perdido norte.
Por mais que relutemos em aceitar o passar do tempo, chega uma hora em que temos que nos submeter a um check-up geral, daqueles que te reviram de ponta cabeça mesmo. As mulheres são muito mais cuidadosas do que nós. É só surgir a primeira menstruação e já criam rotina saudável de agendar visitas periódicas ao ginecologista. Com elas, qualquer sinalzinho diferente na pele é motivo para irem correndo ao dermatologista. Quer mais? Homem só vai ao dentista quando dente dói!
O percentual de mulheres com as cadernetas de vacinação completas é surpreendentemente maior do que o dos homens. Na nossa, geralmente temos a antitetânica e a febre amarela, pois uma é quase sempre exigência trabalhista e, sem a outra, não se atravessa, se frequenta regiões de pesca onde a doença reina selvagem. Homens geralmente gostam de pescar. Eu particularmente só pesco de rede.
Isso mesmo, rede. Chego à beira do rio, acho bela sombra, estendo minha rede, em local mais alto, me deito, pego um bom livro, uma cerveja e, vez ou outra, dou olhada para as canoas. Pesco não.
Que fique bem claro que, infelizmente, estou falando de uma camada da população que domina o conhecimento e tem acesso a serviço médico de qualidade, infelizmente uma minoria. Basta ver as alarmantes estatísticas de casos de câncer de útero, de próstata, de mama, e outras tantas doenças evitáveis, cuja prevenção e atenção médica em muitas cidades estão distantes, fora do alcance da população. Enumerá-las aqui seria um desafio.
Em quase todos nós, ao contrário das mulheres, a segurança absoluta de saúde plena já começa a balançar nas antessalas dos consultórios médicos. Um medo inexplicável vem do quase nada. Digo quase nada, porque, na realidade, ele é totalmente justificado. Já notaram as feições dos outros que estão ali sentados? Uns folheiam revistas vencidas sem ler, batem o pé sem parar em visível estado de tensão, outros lhe dirigem sorrisos sem graça, sorriso esse que pode ser de autopiedade ou de dó da gente a pensar: ”coitado, esse aí está pior do que eu”. Mesmo que você tenha entrado ali para buscar uma receita para outra pessoa, no clima da antessala do doutor você já começa, mentalmente, a escanear seu corpo. Será que aquela dorzinha de cabeça que tive em abril poderia ser um aneurisma? E o formigamento que senti mês passado? A dor no estômago outro dia estava estranha. O pensar que se tem é, às vezes, pior do que ter, pois o que se pode ter, geralmente, é simples de resolver.
Cada um, acredito, tem seu “timing”, seu momento em que percebe que já não é mais o super-homem de ontem que podia todo santo dia se deliciar com dobradinhas do Cidão, feijoadas aos sábados e picanha gorda domingo com a família. Sem contar as cervejas geladas ao fim da tarde, de terça a domingo. Claro, segunda-feira não pode.
Em entrevista que vi de um integrante do famoso Harlem Globetrotters, o atleta respondeu magistralmente à pergunta sobre a hora de parar de jogar: “The head says go the legs say no”, resumindo filosoficamente a condição humana para tudo, não apenas esporte.
O mais interessante, constatei, é que, geralmente, o alerta vem não de seu próprio corpo, mas das conversas entre amigos e colegas, principalmente de trabalho. Se você não tem nada, não faz uso de nenhum medicamento, considere-se fora da roda.
Ou é doença ou futebol. Como não entendo de futebol, além do fato de ser torcedor do Atlético Mineiro, resolvi dar uma geral no corpo para me integrar, pois o antidepressivo que ultimamente ando tomando não conta para o grupo. Não puxa assunto, é medicamento para secar papo. Todos te olham de lado, dando-lhe as costas e continuam:
— Já viram aquele genérico novo para pressão? E aquele outro para gota?
Pois lá fui eu cumprir minha via-crúcis, saindo de meu Pretório particular em busca de Calvário próprio, mas que gerasse assunto e aceitação.
Comecei com o tabu masculino, coisa de brasileiro machão besta, o urológico. Não precisa dizer que, quando voltei à roda, além dos sorrisos cínicos, todos queriam saber como foi. Senti-me incluído. A propósito, passei com louvor no exame. Supercompetente, meu amigo de longa data e urologista solicitou sangue completo para ver o que corria nessas veias abertas de mineiro medroso. O PSA era de criança, mas aí veio o susto. Meu triglicérides estava a ponto de se tornar tetra e a caminho do penta.
Toco a marcar consulta com outro amigo, médico dos bons, que me recomendou medicamento, dieta e exercícios para baixar o tal, isso antes da consultar, pois iria demorar um pouco e queria fazer o cardiológico primeiro.
Outra médica atenciosa e competente. Passei com nota média na esteira, o eco mostrou que ainda tenho coração e o Mapa não registrou nenhuma anomalia. Não preciso dizer que ficar 24 horas com aquele aparelho é duro e incômodo. Dia sem banho e, em uma reunião séria, a mangueirinha do aparelho se soltou. Tem coisa que só acontece comigo. Moral da história: nem um remedinho a mais para tomar. Que falta de assunto para o grupo! Só recebi um “que bom”.
Resumindo, estou criando penas de tanto comer carne de frango. Sinto-me ruminante com tanta salada e sabiá com tanta fruta. Contrariado faço caminhadas diárias sozinho e ainda acho a coisa mais chata do mundo, pois andar com destino é uma coisa, andar por andar não é fácil. Já emagreci mais de 2 kg, mas ainda não posso me dar ao luxo de dizer que me sinto diferente, pois, na realidade, não sentia absolutamente nada antes dos exames.
Sinto falta mesmo é da dobradinha do Cidão, da picanha gorda de domingo e da cerveja gelada. Com essa até sonho. Sorte minha que não fumo há mais de década, senão seria mais um vício a largar. Logo vou ao consultório de meu amigo para avaliação final. Espero que cheguemos a um meio-termo e que, pelo menos uma vez por semana, eu possa me dar ao luxo de alguns excessos. Não precisam ser muitos, a ponto de me atribuírem o pecado da gula, mas que sejam prazerosos, porém controlados.
E para os machões de plantão, uma recomendação se me permitem. Façamos como nossas mulheres, que não são de Atenas. Não vacilem nem demorem muito para check-ups periódicos. Queira ou não, para seu próprio bem, um encontro com um urologista está marcado, mas fique tranquilo, sua virilidade não será em nada maculada e, a partir dessa consulta, poderá descobrir que sua vida estava por um fio e você nem desconfiava.
Por mais que relutemos em aceitar o passar do tempo, chega uma hora em que temos que nos submeter a um check-up geral, daqueles que te reviram de ponta cabeça mesmo. As mulheres são muito mais cuidadosas do que nós. É só surgir a primeira menstruação e já criam rotina saudável de agendar visitas periódicas ao ginecologista. Com elas, qualquer sinalzinho diferente na pele é motivo para irem correndo ao dermatologista. Quer mais? Homem só vai ao dentista quando dente dói!
O percentual de mulheres com as cadernetas de vacinação completas é surpreendentemente maior do que o dos homens. Na nossa, geralmente temos a antitetânica e a febre amarela, pois uma é quase sempre exigência trabalhista e, sem a outra, não se atravessa, se frequenta regiões de pesca onde a doença reina selvagem. Homens geralmente gostam de pescar. Eu particularmente só pesco de rede.
Isso mesmo, rede. Chego à beira do rio, acho bela sombra, estendo minha rede, em local mais alto, me deito, pego um bom livro, uma cerveja e, vez ou outra, dou olhada para as canoas. Pesco não.
Que fique bem claro que, infelizmente, estou falando de uma camada da população que domina o conhecimento e tem acesso a serviço médico de qualidade, infelizmente uma minoria. Basta ver as alarmantes estatísticas de casos de câncer de útero, de próstata, de mama, e outras tantas doenças evitáveis, cuja prevenção e atenção médica em muitas cidades estão distantes, fora do alcance da população. Enumerá-las aqui seria um desafio.
Em quase todos nós, ao contrário das mulheres, a segurança absoluta de saúde plena já começa a balançar nas antessalas dos consultórios médicos. Um medo inexplicável vem do quase nada. Digo quase nada, porque, na realidade, ele é totalmente justificado. Já notaram as feições dos outros que estão ali sentados? Uns folheiam revistas vencidas sem ler, batem o pé sem parar em visível estado de tensão, outros lhe dirigem sorrisos sem graça, sorriso esse que pode ser de autopiedade ou de dó da gente a pensar: ”coitado, esse aí está pior do que eu”. Mesmo que você tenha entrado ali para buscar uma receita para outra pessoa, no clima da antessala do doutor você já começa, mentalmente, a escanear seu corpo. Será que aquela dorzinha de cabeça que tive em abril poderia ser um aneurisma? E o formigamento que senti mês passado? A dor no estômago outro dia estava estranha. O pensar que se tem é, às vezes, pior do que ter, pois o que se pode ter, geralmente, é simples de resolver.
Cada um, acredito, tem seu “timing”, seu momento em que percebe que já não é mais o super-homem de ontem que podia todo santo dia se deliciar com dobradinhas do Cidão, feijoadas aos sábados e picanha gorda domingo com a família. Sem contar as cervejas geladas ao fim da tarde, de terça a domingo. Claro, segunda-feira não pode.
Em entrevista que vi de um integrante do famoso Harlem Globetrotters, o atleta respondeu magistralmente à pergunta sobre a hora de parar de jogar: “The head says go the legs say no”, resumindo filosoficamente a condição humana para tudo, não apenas esporte.
O mais interessante, constatei, é que, geralmente, o alerta vem não de seu próprio corpo, mas das conversas entre amigos e colegas, principalmente de trabalho. Se você não tem nada, não faz uso de nenhum medicamento, considere-se fora da roda.
Ou é doença ou futebol. Como não entendo de futebol, além do fato de ser torcedor do Atlético Mineiro, resolvi dar uma geral no corpo para me integrar, pois o antidepressivo que ultimamente ando tomando não conta para o grupo. Não puxa assunto, é medicamento para secar papo. Todos te olham de lado, dando-lhe as costas e continuam:
— Já viram aquele genérico novo para pressão? E aquele outro para gota?
Pois lá fui eu cumprir minha via-crúcis, saindo de meu Pretório particular em busca de Calvário próprio, mas que gerasse assunto e aceitação.
Comecei com o tabu masculino, coisa de brasileiro machão besta, o urológico. Não precisa dizer que, quando voltei à roda, além dos sorrisos cínicos, todos queriam saber como foi. Senti-me incluído. A propósito, passei com louvor no exame. Supercompetente, meu amigo de longa data e urologista solicitou sangue completo para ver o que corria nessas veias abertas de mineiro medroso. O PSA era de criança, mas aí veio o susto. Meu triglicérides estava a ponto de se tornar tetra e a caminho do penta.
Toco a marcar consulta com outro amigo, médico dos bons, que me recomendou medicamento, dieta e exercícios para baixar o tal, isso antes da consultar, pois iria demorar um pouco e queria fazer o cardiológico primeiro.
Outra médica atenciosa e competente. Passei com nota média na esteira, o eco mostrou que ainda tenho coração e o Mapa não registrou nenhuma anomalia. Não preciso dizer que ficar 24 horas com aquele aparelho é duro e incômodo. Dia sem banho e, em uma reunião séria, a mangueirinha do aparelho se soltou. Tem coisa que só acontece comigo. Moral da história: nem um remedinho a mais para tomar. Que falta de assunto para o grupo! Só recebi um “que bom”.
Resumindo, estou criando penas de tanto comer carne de frango. Sinto-me ruminante com tanta salada e sabiá com tanta fruta. Contrariado faço caminhadas diárias sozinho e ainda acho a coisa mais chata do mundo, pois andar com destino é uma coisa, andar por andar não é fácil. Já emagreci mais de 2 kg, mas ainda não posso me dar ao luxo de dizer que me sinto diferente, pois, na realidade, não sentia absolutamente nada antes dos exames.
Sinto falta mesmo é da dobradinha do Cidão, da picanha gorda de domingo e da cerveja gelada. Com essa até sonho. Sorte minha que não fumo há mais de década, senão seria mais um vício a largar. Logo vou ao consultório de meu amigo para avaliação final. Espero que cheguemos a um meio-termo e que, pelo menos uma vez por semana, eu possa me dar ao luxo de alguns excessos. Não precisam ser muitos, a ponto de me atribuírem o pecado da gula, mas que sejam prazerosos, porém controlados.
E para os machões de plantão, uma recomendação se me permitem. Façamos como nossas mulheres, que não são de Atenas. Não vacilem nem demorem muito para check-ups periódicos. Queira ou não, para seu próprio bem, um encontro com um urologista está marcado, mas fique tranquilo, sua virilidade não será em nada maculada e, a partir dessa consulta, poderá descobrir que sua vida estava por um fio e você nem desconfiava.
Publicado no Jornal Correio em 11/11/11 , data um tanto quanto cabalística, essa e parte 2 em 12/11/11
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