A noite chegou. Horário de verão complica a vida de todo ser vivente, custa a escurecer e o amanhecer demora mais um pouco. Particularmente gosto, pois posso aproveitar um pouco mais o fim de tarde. Confesso, chego ao fim de semana cansado de um não sei o quê. Fico imaginado as gentes que moram na terra de Papai Noel e aproveito o clima de Natal, apesar do mesmo não estar para peixe ou peru. Na Lapônia, que fica encostada no círculo Ártico, acontecem em alguns períodos “noites sem noites”. É quando o sol nunca some na linha do horizonte, corre por ele de ponta a ponta, mas não desaparece.
Assim têm luz vinte e quatro horas por dia, durante meses. Coitados dos poetas, dos seresteiros, dos namorados. Gilberto Gil se lá vivesse, jamais teria composto “Lunik 9”, pois jamais “haveriam derradeiras noites de luar”. Aquela noite, que mansa chegou, seria diferente. Lua nova, escuridão total, canto longe de alguma Mãe da lua, pensando ter perdido sua companhia. Os Urutaus são assim, melancólicos.
Do fundo do breu, uma risadinha arranhada. Um cachorro vigia uivou, de medo. Logo outra risada mais aberta, seguida de outra e mais outra. Depois de certo tempo o que se ouvia era um gargalhar de milhares. Risos de doer o estômago, como quem boa e bem contada piada, ou caso, ouviu. Aquele riso aberto de quem vê alguém levar um tombo em lodo de pedra de riacho. Machucou? Diante da negativa despenca em gargalhar a plenos pulmões. As risadas não paravam. Depois de muito tempo, um movimentar sem fim deu lugar ao riso. Inquietação geral, despencar de lugar algo, esborrachar em chão com som seco, tosses, risos, delírios acéfalos.
Pela manhã, rebordosa geral. Todos para o caminhão. O chacoalhar martelava cada pedaço. Ressaca assim nem de cachaça de carotinho de cinquenta centavos. Quem disse que conseguiam ficar em formação ali na carroceria? Para espanto geral, mal se mantinham, e não era o balanço de estrada esburacada não, a zoeira estava dentro de cada um. Volta e meia, quando o vento conseguia levantar parte da lona que os cobria e uma brisa gostosa entrava sem educação, o alívio era breve. Alguns mais resistentes ainda davam longas, sinistras e sonoras gargalhadas. Motorista e ajudante se entreolhavam arredios na boleia.
Aqueles tijolos, depois da queima de droga tipo cocaína, crack, cigarro falsos, toneladas de “Maruamba” em forno de cerâmica pela Polícia Federal, por muito tempo não iriam prestar para levantar paredes, podia até bater prumo, mas logo, no meio da linhada assentada, um risinho arranhado se faria ouvir e logo a algazarra novamente se instalaria.
Pedreiro assentava hoje, no dia seguinte, encontrava confusão de formatos de paredes do nada, efeito “poltergeist”. Amanheciam de ponta cabeça equilibrados em apenas um cabo de enxada. Os tijolos, muito doidos, não conseguiam ficar parados em pilhas. Farra do bode no transporte até a obra, depois só confusão. E cadê peão para voltar trabalhar nessa obra?
Roubo frase de, nem acredito, “Max Payne” um game antigo: “Não sei quanto aos anjos, mas o medo é que dá asas aos homens…” Ótimo domingo!
Jornal Correio em 13 de dezembro de 2015
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