quinta-feira, setembro 6

Turismo




Muita gente brinca que o brasileiro deveria ser estudado pela NASA. Acredito que na maioria das vezes o dito em tom de brincadeira toma ares de verdade nua e crua. Temos bons e terríveis exemplos para justificar uma análise mais aprofundada de nossas condutas e fazeres. Ouvi de amigo que em um estudo científico ficaria difícil a decisão em qual tabela nos encaixar.
Contam que, em uma viagem de férias pela região das vinícolas da serra gaúcha, seguiam casal e filho miudinho em cadeirinha de segurança e tudo, em conformidade com a lei.

Visitaram os vinhedos tradicionais de Gramado, Bento Gonçalves, Canela, Caxias do Sul e Garibaldi. Como ainda tinham tempo de sobra, se aventuraram pelas belas paisagens de Flores da Cunha, Farroupilha, Pinto Bandeira e a pequena, e repleta de histórias, Entre-Ijuís.

Seria ufanismo querer comparar essa região com a Toscana, na bela Itália, mas mesmo assim as belezas naturais e o estilo europeu de ser sobrevivem fortemente aqui em nosso Brasil sul. Claro que em tour como este, turistas não conseguem ficar sem provar em cada pousada, restaurante ou recanto, o vinho da casa, produzido ali mesmo, preservando costumes ancestrais. Uva pisoada ritmicamente em tanques de pedra, contam que o bom vinho depende dos calcanhares de quem pratica a "pisa". Ali mesmo onde os cachos são espremidos o mosto é fermentado. Cada um com seu jeito e gosto. O tempo se encarrega de dar o toque final. Guardados em imensos tonéis, geralmente de carvalho, descansam em sonho tranquilo até o momento do envasilhar.
Nosso incauto se esquece de que está dirigindo e depois de algumas boas taças não tem como não ficar um pouco mais, digamos, alegre.

Numa estrada exuberante, fechada em túneis de belas árvores, que faziam do sol caleidoscópio por entre as folhas, surge ligeira curva. Pronto! No virar dá de encontro com barreira policial. Obedeceu imediatamente o sinal de parar. Encostou, abrindo o vidro, dando uma de duro:
─ Bom dia Sêo guarda!
─ Bom dia meu senhor, por favor, documentos do carro e carteira de motorista! Uma educação pouco vista.
─ Pois não, aqui estão.
O policial rodoviário, com os documentos na mão, contornou o carro, verificou placa e com sorriso sincero no rosto comentou:
─ Bá, tchê vieram de longe, apreciando o belo Rio Grande?
─ O senhor não tem ideia o quanto. Pretendemos voltar sempre.
─ Ficamos felizes. Temos muito orgulho de nossa terra. Aproveitando a parada e não querendo tomar muito tempo de seu passeio, o senhor se incomodaria de soprar em nosso etilômetro, ou bafômetro, como dizem em tua região? É simples como tomar um baita chimarrão ao contrário tché.
─ Claro, sem problema sêo guarda, com prazer - já sabendo que ia levar bronca.
Soprou com força e não deu outra. Pequena, mas significante alteração. Nada que classifique o motorista como embriagado, mas acima de 0,5 miligramas deu.
O Guarda:
─ Meu senhor, acho que temos um problema aqui. Acredito que o senhor andou provando muito de nossos vinhos. Teremos que deter o senhor.
─ Peraí - em retruco calmo. Este aparelho foi aferido pelo Inmetro? Se foi, onde está o selo e a data da avaliação?
─ Olha senhor, não sei lhe dizer, mas estes equipamentos não costumam falhar.
─ Então vamos fazer um teste. Está vendo meu bebê dormindo no banco de trás? Autorizo o senhor a fazer o teste com ele e aí vamos ver no que dá. Tudo bem?
─ Sem dúvida. Vamos sim fazer com o piá!
E assim foi. Com cuidado danado e sem acordar a criança o guarda conseguiu que o sopro fosse capturado.
─ Bá e não é que deu positivo também! Em susto, observou o rodoviário. Tens razão, este aparelho deve estar com defeito. Desculpem-me e sigam em paz. Boa viagem. Voltem sempre. O Rio Grande do Sul vos abraça.

Com pequeno aceno de despedida seguiram trecho. Até aquele momento a mulher manteve um silêncio absoluto, não muito normal em tais situações, mas ficou em um balançar de cabeça sem fim.
─ Ô mulher fica brava assim não. Eu estava tão errado em dar um pouquinho de vinho para nosso filho dormir? Iria ajudar! E não ajudou?
NASA, mande gente. Fast!







Publicado em Diário de Uberlândia em 02 de setembro de 2018

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