quinta-feira, fevereiro 19

Vício



Mas, afinal de contas, o que é um vício? Não me refiro aos Vícios com V maiúsculo, tipo fumar, usar hard drugs, jogar baralho, frequentar cassinos clandestinos, coisas assim. Falo de vícios normais, do cotidiano. Contemplar belezas da vida, o vício de amar, o vício por boa música, boa companhia, o fabuloso e já raro vício de ler, vício de viver e contar da vida, vício de escrever. Aí eu me peguei ou me ferrei.

Acostumando, ou viciado, a dedilhar todo dia, tem que acontecer algo muito diferente e estranho para que não me pegue com meu livrinho de notas, meu notebook e, de um tempo para cá, mesmo sofrendo martírio de letras miúdas, dedos grossos e vista fraca de meu smartphone – e ele aparelho, se acha esperto – o bichinho se tornou um salvador de ideias, claro que no transcrever as correções são milhares. Letras trocadas, frases inteiras sem sentido; custo a decifrar. Na falta de caneta e papel, ele bem que ajuda. Sou o maior “enviador” de mensagens eletrônicas para mim mesmo. Abafa solidão, sempre terei uma mensagem minha a esperar. Não cheguei à fase de responder as minhas próprias mensagens nem de curtir spam, mas…

Se procurar em qualquer dicionário vai encontrar definições de vício que vão lhe deixar de cabelo em pé, olha só: Defeito ou imperfeição. Prática frequente de ato considerado pecaminoso. Tendência para contrariar a moral estabelecida. Hábito inveterado. Dependência do consumo de uma substância. Erro de ofício. Erro habitual no uso da língua. Mau hábito ou costume que as bestas adquirem = Manha
Consultei várias coleções de palavras na esperança sempre verde de encontrar significado que me aliviasse. Nada achei. Comecei a me sentir um pervertido pronto a “perturbar a ordem ou o estado das coisas”. Palavras deles, os léxicos. Essa definição até me deu um “up”, pois é exatamente o que todos nós gostaríamos de fazer para vida melhor viver, ar mais puro respirar.

Mas já que sou viciado em escrever vou tentar me encaixar no que me classificam. É defeito ou imperfeição escrever? Acho que sim, pois quem escreve tende a pensar e isso hoje mais parece defeito de fábrica. Eu tendo a contrariar a moral estabelecida? Todo humano pensante deve ter esta tendência, se você como eu luta contra a homofobia, a xenofobia ou qualquer tipo de preconceito, bem-vindo ao time dos que lutam contra uma moral indecente estabelecida. Mania, bom esta está clara e com ela concordo. Dependência de consumo de alguma substância, eita se tenho, consumo substâncias literárias, poemas, ensaios, contos, não me importa gênero tanto faz narrativas ou líricos. Jamais me internem em clínicas de desintoxicação de leituras.

Habitualmente, erro no uso da linguagem? Como sou um anarquista na escrita, devo cometer milhões de erros, nasci para descumprir regras, se as seguisse não sentiria prazer em meu vício de escrever.
Manhoso sou, besta que não, senhor dicionário. Lembrei Novos Baianos: “Por que não viver?/ Não viver esse mundo/ Por que não viver?/ Besta é tu!/ Besta é tu! Besta é tu!”






Publicado em Jornal Correio em 15 de fevereiro de 2015




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