quarta-feira, dezembro 7

Pena de morte



Acompanho atento, aqui no CORREIO, o saudável debate sobre a pena de morte. Um SIM contundente e um NÃO bem embasado deram o tom da discussão. Particularmente, muito acredito que a tal já está em vigor desde o descobrimento, desde a chegada das caravelas embaladas por vento norte até o porto seguro da terra brazilis. Primeiro, entregamos miçangas e espelhinhos aos legítimos donos das praias, matas e tantas riquezas desejadas, depois, seja com bacamarte ou simples gripe, os levamos quase à extinção.

Hoje, em ato de mea culpa, o Estado tenta compensar aos filhos dos filhos daqueles que escaparam do holocausto tupiniquim concedendo e demarcando enormes glebas de terra a uns poucos que, por sua vez, em pleno século 21 continuam condenados à mesma pena de morte colonial. Hoje, os verdugos grileiros, garimpeiros e aventureiros que continuam, quando não recorrendo às armas, levam suas injeções letais em forma também de doenças.

Voltando à história: vieram os negros. Condenados ainda lá em mãe África ao degredo, sofrimento e morte. Muitos sucumbiam ainda nos porões das negras naus do terror muito antes de aqui aportarem. Avançando alguns séculos, esbarramos novamente com o tal século 21 e os afrodescendentes ainda são as maiores vítimas de penas de morte veladas. Basta observar qualquer estatística, por mais tendenciosa e malfeita que seja. Os negros continuam sendo as maiores vítimas de violência policial, social e econômica.

São abatidos, muitas vezes, pelo simples fato de estar andando nas ruas em horas e lugares, para alguns, “indevidos”. Não muito tempo atrás, contam, nem no Cine Uberlândia eles eram aceitos e no footing da praça eram obrigados a andar fora da calçada. Morte em vida. Preconceito também mata, portanto forma sublinear de pena de morte étnica.

Traficantes conduzem livremente o seu negócio macabro, condenando e aí democraticamente, pois não tem cor, sexo ou condição social que escape, milhares à lenta morte pelo vício. As milícias pipocam em cada bairro e, sob os olhares e proteção dos “homens de bem”, aprovam e aplaudem a cada corpo de ladrão, drogado ou andarilho encontrado com perfuração de bala na cabeça e na palma da mão, assinatura inconfundível de quem fez história aplicando pena máxima ao seu bel- prazer.

Só falta agora oficializar. Aparecer algum político e sugerir plebiscito e assim mudar nossa carta magna, então os hipócritas, vestidos de bons moços, fingirão esbravejo e votarão a favor. Aliás, em termos de Justiça, o Brasil sempre engendrou pelas tortuosas vias da contramão.

Uma polícia honesta e respeitada que tenha certeza que aqueles que prendem ficarão presos pelo tempo que forem condenados. Uma urgente reforma no Código Penal ou sei lá onde que deve se dar, mas que tenha menos brechas e artifícios para safar bandido. Mas não podemos esquecer que somos todos uma simbiose de santo e demônio. Cansados, quando a impunidade bate à nossa porta e envolve entes queridos, não raro desperta em qualquer um, no mais pacato dos humanos, o Código de Hamurabi ou lei do talião citado pela senhora Nereide Jorge em artigo outro dia. Não há sensatez, equilíbrio ou discurso que possam emudecer a besta que habita os labirintos escuros de nossa condição animal. Se o Estado falha, o bicho homem em apocalipse mostra suas garras. Instala-se a barbárie.











Publicado no Jornal Correio em 07/12/2011

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