Sei que muitas vezes águas passadas não movem a azenha. Mas não raro me pego bovinamente, e isso nada tem a ver com as esculturas das vaquinhas da versão cerrado da CowParede a ruminar artigos e comentários pelos quais fiz atenta leitura.
Em certeiro comentário, o leitor André Garcia Cunha cunhou — o jogo de palavras com o seu sobrenome foi involuntário, juro — o texto Patrulhamento ideológico (CORREIO de Uberlândia, Opinião do leitor, 25/10/2008), onde, com muita propriedade, rebate outro leitor que havia criticado o jornalista Ivan Santos, pelo uso da expressão “fumam qualquer cachimbo”. Apologia ao tabaco segundo aquele.
Intróito difícil esse. Acho que me situei. O mundo das diferenças, do livre pensar. Partindo dessa premissa muita coisa teria que ser mudada. Começando pelo nosso Saci Pererê. Ala de fumantes na mata para poder continuar a existir no imaginário popular. Afinal saci sem cachimbo e brincando com a brasa não é saci que se preze. Contar história dele então pode mais não, politicamente incorreto. Alguém pode evocar o Estatuto da Criança e do Adolescente, por induzir inocentes ao uso do cachimbo. Saci desempregado tomou rasteira.
Expressões como “está no pau da goiaba” jamais poderiam ser mencionadas, pois teria conotação ofensiva para alguns.
Cuidado com “nem que a vaca tussa”, pois pode gerar problemas de ordem sanitária.
“Comprar gato por lebre”, loucura, nem pensar. Dá Procon, sem contar a bronca com o Ibama por suspeita de comercialização de animais silvestres. É cana certa. Atenção patrulha: cana aqui é cadeia, viu, não é a planta, entenderam?
Quer ser tachado de criminoso ambiental? Se atreva a escrever algo tipo assim “matar dois coelhos com uma cajadada”! “Devagar com o andor que o santo é de barro”. Graves problemas religiosos à vista. Quer comprar briga maior? Então, arrisque usar a expressão “será que joguei pedra na cruz?”. Para meia dúzia, após tribunal inquisitório, no mínimo a “purificadora” fogueira.
“É tarde, Inês é morta” pode dar escuta telefônica e campana policial: suspeita de crime hediondo.
Outras frases podem, se alguém assim interpretar, gerar (in)conseqüências se levadas ao “pé da letra”. Pronto, essa também passou despercebida. “Fazer vaquinha”, “pensando na morte da bezerra”, “rasgar seda”, “enfiou o pé na jaca”, “quem não tem cão, caça com gato” e muitos outros ditados e expressões populares podem ficar na mira do patrulhamento “sem pé nem cabeça”. Essa aí escapou! O escrever torna-se tortuosa e cansativa tarefa, o ler insuportavelmente aborrecido.
A prevalecer este tipo de interpretações tão literais, nem fábrica de macarrão de letrinha vai escapar do crivo das neuras. E nós, mesmo aqui no cerrado tão longe do mar, ficaríamos “a ver navios”, cuidando para “não dourar a pílula” e sermos acusado de apologia às drogas, dando nosso “voto de Minerva” com medo de estar vendendo sabão em pó.
Enfim, o canto do cisne será mudo e ecologicamente incorreto.
Nossa língua pátria ficaria sem eira nem beira, e para fugir das rondas da censura, só apelando para o Millôr, pois a “vaca foi para o brejo’, Perdão: “the cow went to the swamp”.
Espera aí. Pensando bem, melhor mesmo é jamais “entregar a rapadura” e “rodar a baiana” contra todo tipo de patrulhamento chato. Ou não?
No Jornal Correio AQUI
"Se for falar mal de mim me chame, sei coisas horríveis a meu respeito" (Clarice Lispector)
sexta-feira, outubro 31
quinta-feira, outubro 30
Agora eu vi!
MPF vai à Justiça para que cervejarias indenizem a população por danos à saúde
Marco Antônio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Uma ação civil pública ajuizada hoje (28) pelo Ministério Público Federal (MPF) em São José dos Campos (SP) contra as empresas de cervejaria Ambev, Schincariol e Femsa pediu indenização pelo aumento dos danos causados pelo consumo de cerveja e chopp.
O pedido de indenização pelo crescimento dos danos causados pelo consumo de bebida alcoólica é estimado na ação em cerca de R$ 2,8 bilhões. A indenização foi calculada com base em gastos federais no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e despesas previdenciárias, em razão de doenças ou lesões diretamente relacionadas com o consumo de álcool.
As bases que sustentam a ação são apurações do próprio MPF, somadas a pesquisas e textos científicos nacionais e estrangeiros. Dados da Unifesp e do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), por exemplo, revelam que o consumo de álcool é responsável por mais de 10% de doenças e mortes no país, provoca 60% dos acidentes de trânsito e leva 65% dos estudantes de 1º e 2º graus à ingestão precoce.
Segundo o procurador da República Fernando Lacerda Dias, as três empresas acionadas respondem por 90% do mercado cervejeiro nacional, com quase R$ 1 bilhão investido em publicidade, segundo dados de 2007. Há pesquisas que apontam a forte influência publicitária, por exemplo, na maioria dos adolescentes.
“Essas ações agressivas de publicidade refletem diretamente no aumento do consumo de álcool pela sociedade e na precocidade do consumo. Os jovens começam a beber cada vez mais e mais cedo”, criticou Dias. Para o MPF, as empresas devem ser condenadas a investir em prevenção e tratamento dos malefícios do consumo de álcool o mesmo valor pago em publicidade de cerveja e chopp.
Procuradores sustentam que, enquanto o SUS gastou, entre 2002 e 2006, aproximadamente R$ 37 milhões com tratamento de dependentes de álcool (e outras drogas) em unidades extra-hospitalares e mais R$ 4 milhões com internações, a indústria de cervejas no Brasil gasta mais de R$ 700 milhões por ano em publicidade.
Fonte: Agência Brasil
Primeiros anos
No começo nada havia. No ar apenas ondas de rádios, televisões e, claro, cinzentos satélites espiões. Estática sem estética.
No começo quase nada nos céus. Nada muito além do azul, de aviões de carreira, aves migratórias, balões de São João e fogos de artifício. Azáfama pólvora.
No começo a solidão das letras; presas em livros, jornais e revistas por vezes, como pão esquecido, mofavam. Querendo ganhar mundos e fundos. Pacientemente em apertados tipos, capas e sebos, alguns às traças outras às moscas, aguardavam.
Era apenas o começo. A mudanças estavam por vir. Óvulo fecundado, vida nova criada, sem percalços ou interrupções o caminho seria um só: o despertar, o nascimento, o soar das trombetas, fartamente anunciadas em bem elaboradas e coloridas filipetas. Pierrot a sorrir.
Serafins, Querubins, Tronos, Dominações, Potestades, Virtudes, Principados, Arcanjos e Anjos, muitos Anjos em revoada silenciosa migraram, éter-luz.
Destino: novas nuvens de silício e bits, cyber-céu.
Nuvens aos pouco povoadas por uma gente diferente. Nem tão gente, nem tão anjo. Gente-sentimento, gente-luz. Gente criadora de sonhos e caminhos. Alquimistas das letras a lapidar incessantemente a pedra filosofal da imaginação, um eterno transmutar de tudo em letras, emoção e calor.
Do começo, apenas lembranças, nesse ninho de condensados elementos habita o povo-anjo, nada mais será como antes, pois lá, naquele cantinho seus habitantes são forjadas em brilhante/nobre metal, forte fibra.
Gente literata, gentil, cordata.
Anjos?
Claro que sim, mas estes caro amigo, forjados em mística bigorna e martelo, da mais pura e fina Prata.
No começo quase nada nos céus. Nada muito além do azul, de aviões de carreira, aves migratórias, balões de São João e fogos de artifício. Azáfama pólvora.
No começo a solidão das letras; presas em livros, jornais e revistas por vezes, como pão esquecido, mofavam. Querendo ganhar mundos e fundos. Pacientemente em apertados tipos, capas e sebos, alguns às traças outras às moscas, aguardavam.
Era apenas o começo. A mudanças estavam por vir. Óvulo fecundado, vida nova criada, sem percalços ou interrupções o caminho seria um só: o despertar, o nascimento, o soar das trombetas, fartamente anunciadas em bem elaboradas e coloridas filipetas. Pierrot a sorrir.
Serafins, Querubins, Tronos, Dominações, Potestades, Virtudes, Principados, Arcanjos e Anjos, muitos Anjos em revoada silenciosa migraram, éter-luz.
Destino: novas nuvens de silício e bits, cyber-céu.
Nuvens aos pouco povoadas por uma gente diferente. Nem tão gente, nem tão anjo. Gente-sentimento, gente-luz. Gente criadora de sonhos e caminhos. Alquimistas das letras a lapidar incessantemente a pedra filosofal da imaginação, um eterno transmutar de tudo em letras, emoção e calor.
Do começo, apenas lembranças, nesse ninho de condensados elementos habita o povo-anjo, nada mais será como antes, pois lá, naquele cantinho seus habitantes são forjadas em brilhante/nobre metal, forte fibra.
Gente literata, gentil, cordata.
Anjos?
Claro que sim, mas estes caro amigo, forjados em mística bigorna e martelo, da mais pura e fina Prata.
quarta-feira, outubro 29
Pernas, pra que te quero?
Pernas, pra que te quero?
Se preciso correr, por favor não me falhe
deixe meus medos em poeira vermelha de terra massapé
Assim, saberei com certeza o quanto me vale.
Pernas, pra que te quero?
Em minhas andanças de vida não venha com manqueiras
conduz meus sonhos e desejos por estradas curvas e tortuosas
Me faça correr galope forte entre deliciosas e frondosas mangueiras
Pernas, pra que te quero?
permita que eu ande sempre descalço, carregue meus pés, me faça bom de bola
Em campo de várzea, grama, terra ou areia,
Dribles e fintas de craque que na vida, deita e rola
Pernas, pra que te quero?
Me faça por favor fiel aos meus princípios principalmente pessoa sem heróis
Que me bastem amigos verdadeiros, homens, mulheres ou bichos
Assim, em comunhão, viveremos em cores de perfeitas auroras boreais
Pernas, pra que te quero?
Para a vida agradecer
Se preciso correr, por favor não me falhe
deixe meus medos em poeira vermelha de terra massapé
Assim, saberei com certeza o quanto me vale.
Pernas, pra que te quero?
Em minhas andanças de vida não venha com manqueiras
conduz meus sonhos e desejos por estradas curvas e tortuosas
Me faça correr galope forte entre deliciosas e frondosas mangueiras
Pernas, pra que te quero?
permita que eu ande sempre descalço, carregue meus pés, me faça bom de bola
Em campo de várzea, grama, terra ou areia,
Dribles e fintas de craque que na vida, deita e rola
Pernas, pra que te quero?
Me faça por favor fiel aos meus princípios principalmente pessoa sem heróis
Que me bastem amigos verdadeiros, homens, mulheres ou bichos
Assim, em comunhão, viveremos em cores de perfeitas auroras boreais
Pernas, pra que te quero?
Para a vida agradecer
terça-feira, outubro 28
segunda-feira, outubro 27
sexta-feira, outubro 24
CowParede
quinta-feira, outubro 23
quarta-feira, outubro 22
Famigerado
Guimarães Rosa
— "Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: fasmisgerado... faz-megerado... falmisgeraldo... familhas-gerado...?
Disse, de golpe, trazia entre dentes aquela frase. Soara com riso seco. Mas, o gesto, que se seguiu, imperava-se de toda a rudez primitiva, de sua presença dilatada. Detinha minha resposta, não queria que eu a desse de imediato. E já aí outro susto vertiginoso suspendia-me: alguém podia ter feito intriga, invencionice de atribuir-me a palavra de ofensa àquele homem; que muito, pois, que aqui ele se famanasse, vindo para exigir-me, rosto a rosto, o fatal, a vexatória satisfação?
— "Saiba vosmecê que saí ind'hoje da Serra, que vim, sem parar, essas seis léguas, expresso direto pra mor de lhe preguntar a pregunta, pelo claro..."
Se sério, se era. Transiu-se-me.
— "Lá, e por estes meios de caminho, tem nenhum ninguém ciente, nem têm o legítimo — o livro que aprende as palavras... É gente pra informação torta, por se fingirem de menos ignorâncias... Só se o padre, no São Ão, capaz, mas com padres não me dou: eles logo engambelam... A bem. Agora, se me faz mercê, vosmecê me fale, no pau da peroba, no aperfeiçoado: o que é que é, o que já lhe perguntei?"
Se simples. Se digo. Transfoi-se-me. Esses trizes:
— Famigerado?
— "Sim senhor..." — e, alto, repetiu, vezes, o termo, enfim nos vermelhões da raiva, sua voz fora de foco. E já me olhava, interpelador, intimativo — apertava-me. Tinha eu que descobrir a cara. — Famigerado? Habitei preâmbulos. Bem que eu me carecia noutro ínterim, em indúcias. Como por socorro, espiei os três outros, em seus cavalos, intugidos até então, mumumudos. Mas, Damázio:
— "Vosmecê declare. Estes aí são de nada não. São da Serra. Só vieram comigo, pra testemunho..."
Só tinha de desentalar-me. O homem queria estrito o caroço: o verivérbio.
— Famigerado é inóxio, é "célebre", "notório", "notável"...
— "Vosmecê mal não veja em minha grossaria no não entender. Mais me diga: é desaforado? É caçoável? É de arrenegar? Farsância? Nome de ofensa?"
— Vilta nenhuma, nenhum doesto. São expressões neutras, de outros usos...
— "Pois... e o que é que é, em fala de pobre, linguagem de em dia-de-semana?"
— Famigerado? Bem. É: "importante", que merece louvor, respeito...
— "Vosmecê agarante, pra a paz das mães, mão na Escritura?"
Se certo! Era para se empenhar a barba. Do que o diabo, então eu sincero disse:
— Olhe: eu, como o sr. me vê, com vantagens, hum, o que eu queria uma hora destas era ser famigerado — bem famigerado, o mais que pudesse!...
— "Ah, bem!..." — soltou, exultante.
Saltando na sela, ele se levantou de molas. Subiu em si, desagravava-se, num desafogaréu. Sorriu-se, outro. Satisfez aqueles três: — "Vocês podem ir, compadres. Vocês escutaram bem a boa descrição..." — e eles prestes se partiram. Só aí se chegou, beirando-me a janela, aceitava um copo d'água. Disse: — "Não há como que as grandezas machas duma pessoa instruída!" Seja que de novo, por um mero, se torvava? Disse: — "Sei lá, às vezes o melhor mesmo, pra esse moço do Governo, era ir-se embora, sei não..." Mas mais sorriu, apagara-se-lhe a inquietação. Disse: — "A gente tem cada cisma de dúvida boba, dessas desconfianças... Só pra azedar a mandioca..." Agradeceu, quis me apertar a mão. Outra vez, aceitaria de entrar em minha casa. Oh, pois. Esporou, foi-se, o alazão, não pensava no que o trouxera, tese para alto rir, e mais, o famoso assunto.
Em "Primeiras Estórias", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1988, pág. 13.
— "Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: fasmisgerado... faz-megerado... falmisgeraldo... familhas-gerado...?
Disse, de golpe, trazia entre dentes aquela frase. Soara com riso seco. Mas, o gesto, que se seguiu, imperava-se de toda a rudez primitiva, de sua presença dilatada. Detinha minha resposta, não queria que eu a desse de imediato. E já aí outro susto vertiginoso suspendia-me: alguém podia ter feito intriga, invencionice de atribuir-me a palavra de ofensa àquele homem; que muito, pois, que aqui ele se famanasse, vindo para exigir-me, rosto a rosto, o fatal, a vexatória satisfação?
— "Saiba vosmecê que saí ind'hoje da Serra, que vim, sem parar, essas seis léguas, expresso direto pra mor de lhe preguntar a pregunta, pelo claro..."
Se sério, se era. Transiu-se-me.
— "Lá, e por estes meios de caminho, tem nenhum ninguém ciente, nem têm o legítimo — o livro que aprende as palavras... É gente pra informação torta, por se fingirem de menos ignorâncias... Só se o padre, no São Ão, capaz, mas com padres não me dou: eles logo engambelam... A bem. Agora, se me faz mercê, vosmecê me fale, no pau da peroba, no aperfeiçoado: o que é que é, o que já lhe perguntei?"
Se simples. Se digo. Transfoi-se-me. Esses trizes:
— Famigerado?
— "Sim senhor..." — e, alto, repetiu, vezes, o termo, enfim nos vermelhões da raiva, sua voz fora de foco. E já me olhava, interpelador, intimativo — apertava-me. Tinha eu que descobrir a cara. — Famigerado? Habitei preâmbulos. Bem que eu me carecia noutro ínterim, em indúcias. Como por socorro, espiei os três outros, em seus cavalos, intugidos até então, mumumudos. Mas, Damázio:
— "Vosmecê declare. Estes aí são de nada não. São da Serra. Só vieram comigo, pra testemunho..."
Só tinha de desentalar-me. O homem queria estrito o caroço: o verivérbio.
— Famigerado é inóxio, é "célebre", "notório", "notável"...
— "Vosmecê mal não veja em minha grossaria no não entender. Mais me diga: é desaforado? É caçoável? É de arrenegar? Farsância? Nome de ofensa?"
— Vilta nenhuma, nenhum doesto. São expressões neutras, de outros usos...
— "Pois... e o que é que é, em fala de pobre, linguagem de em dia-de-semana?"
— Famigerado? Bem. É: "importante", que merece louvor, respeito...
— "Vosmecê agarante, pra a paz das mães, mão na Escritura?"
Se certo! Era para se empenhar a barba. Do que o diabo, então eu sincero disse:
— Olhe: eu, como o sr. me vê, com vantagens, hum, o que eu queria uma hora destas era ser famigerado — bem famigerado, o mais que pudesse!...
— "Ah, bem!..." — soltou, exultante.
Saltando na sela, ele se levantou de molas. Subiu em si, desagravava-se, num desafogaréu. Sorriu-se, outro. Satisfez aqueles três: — "Vocês podem ir, compadres. Vocês escutaram bem a boa descrição..." — e eles prestes se partiram. Só aí se chegou, beirando-me a janela, aceitava um copo d'água. Disse: — "Não há como que as grandezas machas duma pessoa instruída!" Seja que de novo, por um mero, se torvava? Disse: — "Sei lá, às vezes o melhor mesmo, pra esse moço do Governo, era ir-se embora, sei não..." Mas mais sorriu, apagara-se-lhe a inquietação. Disse: — "A gente tem cada cisma de dúvida boba, dessas desconfianças... Só pra azedar a mandioca..." Agradeceu, quis me apertar a mão. Outra vez, aceitaria de entrar em minha casa. Oh, pois. Esporou, foi-se, o alazão, não pensava no que o trouxera, tese para alto rir, e mais, o famoso assunto.
Em "Primeiras Estórias", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1988, pág. 13.
terça-feira, outubro 21
Farrapo humano
(matutando Nietzsche)
Discreto por necessidade, abandonado, sempre só
fez da vida tortuoso caminho, largou tudo e todos
das paixões ficou apenas miserável e fino pó.
Não adiantava, nem acurada perseverança
lutou com garras aduncas de pássaro de rapina
mas nada restava, nenhuma ligeira esperança.
Antiga pertinácia, substituída pelo mais puro e destruidor medo,
já não buscava refúgio seguro
a sorte a escorrer pelas mãos, não mais fazia da vida segredo.
Entregue a torpe destino a alma em chamas coração em frangalhos
resignado assistia o correr do tempo
na pele carcomida invisíveis mas doloridos bugalhos
Nada restava fazer senão mergulhar em sonhos
porém por mais que tentasse não conseguia os olhos fechar
quando assim o fazia apenas fantasmas medonhos
O sono era martírio pleno e cochilo tortura
entre trapos e tristes lembranças
Jogou-se em gran finale, no inexpugnável poço da loucura.
Discreto por necessidade, abandonado, sempre só
fez da vida tortuoso caminho, largou tudo e todos
das paixões ficou apenas miserável e fino pó.
Não adiantava, nem acurada perseverança
lutou com garras aduncas de pássaro de rapina
mas nada restava, nenhuma ligeira esperança.
Antiga pertinácia, substituída pelo mais puro e destruidor medo,
já não buscava refúgio seguro
a sorte a escorrer pelas mãos, não mais fazia da vida segredo.
Entregue a torpe destino a alma em chamas coração em frangalhos
resignado assistia o correr do tempo
na pele carcomida invisíveis mas doloridos bugalhos
Nada restava fazer senão mergulhar em sonhos
porém por mais que tentasse não conseguia os olhos fechar
quando assim o fazia apenas fantasmas medonhos
O sono era martírio pleno e cochilo tortura
entre trapos e tristes lembranças
Jogou-se em gran finale, no inexpugnável poço da loucura.
segunda-feira, outubro 20
Tio Fábio
Difícil falar da perda de quem muito gostamos. Semana passada, tio Fábio se foi. O Fábio Borges escrivão. Torcedor fanático do Verdão, talvez nem tanto desse Verdão de hoje. Do antigo foi conselheiro. Tive o privilégio de conviver com esta alma ímpar e do bem por bons 30 anos. Coração do tamanho do mundo, sempre com piada pronta e um sorriso para todos. Ontem perdemos tio Fábio.
Não, ontem não perdemos tio Fábio. Como perder pessoa tão meiga, direta, carinhosa? Ele agora mais do que nunca deixa de ser apenas pessoa folclórica de nossa Uberlândia para se tornar uma lenda familiar e forense.
Soube como poucos bem carregar sua cruz. Em seus momentos de crise, fez do amargo, estímulo para alentar e rir de si mesmo. Ele nos contava suas histórias com indisfarçável e merecido orgulho das pessoas queridas que lhe estenderam a mão. Não posso enumerá-las todas, medo de ser injusto, pois estas lembranças eram dele, muitas das vezes não compartilhadas. Uma em especial por quem ele nutria grande carinho e amor fraterno, era constantemente mencionada em seus casos, não posso deixar de mencionar, dr. Sebastião Lintz, seus olhos sempre se iluminavam ao falar dele.
Homem dos fóruns, isso mesmo, no plural, tio Fábio começou muito novo ainda no antigo. Demolido, para sua perplexidade, sem deixar vestígios. Viu a construção do novo até este se tornar pequeno. Prova disso que, mesmo depois de aposentado, não deixava de lá estar todos os dias a conversar e trocar idéias com seus amigos do coração. Um dia foram “expulsos” da velha cantina, local de encontro onde batia o ponto, para dar lugar a novas salas. O grupo não se intimidou foi se albergar na garagem do prédio. A prosa, o companheirismo puro e verdadeiro não se abalaria por tão pouco. Raro perder um dia lá, tinha verdadeira adoração pelo lugar, mas principalmente por seus amigos.
Datilógrafo exímio, daqueles de dois dedos. Sua destreza na boa e velha Remington chamava a atenção de quem passava e o via trabalhar, parecia que dos tipos sairiam fumaça dada a velocidade. Eram letras para todos os lados. Sem contar a rapidez e vigor ao retornar o carro da máquina, barulho seco, eterno na memória. Nunca se encantou com computador, com muito custo enfrentou as máquinas elétricas.
Seus óculos de fundo de garrafa por várias vezes assustaram seus sobrinhos-netos, meus filhos, e ele adorava brincar de bravo, mas era só por um segundo, pois logo se abria em carinhoso abraço e dizia manso: chora não, sou eu, tio Fábio. As então crianças em seu peito se aninhavam. Unanimidade? Creio que esta não existe. Mas posso apostar. Era homem de poucos desafetos, um ou outro talvez, para confirmar a regra.
Tio Fábio merece um tratado, monografia de sua vida. Suas histórias dariam vários livros. Muitos poderiam dele falar.
Tio Fábio agora se encontra em plano superior, com ele nossa querida Vó Filhinha, tio Zé, Vô Ítalo e outros tantos irmãos.
O Criador vai ter muito trabalho em pôr ordem na casa de agora em diante, tio Fábio chegou. Chamou?
Agora agüenta.
(Aqui no Jornal Correio em pdf)
Não, ontem não perdemos tio Fábio. Como perder pessoa tão meiga, direta, carinhosa? Ele agora mais do que nunca deixa de ser apenas pessoa folclórica de nossa Uberlândia para se tornar uma lenda familiar e forense.
Soube como poucos bem carregar sua cruz. Em seus momentos de crise, fez do amargo, estímulo para alentar e rir de si mesmo. Ele nos contava suas histórias com indisfarçável e merecido orgulho das pessoas queridas que lhe estenderam a mão. Não posso enumerá-las todas, medo de ser injusto, pois estas lembranças eram dele, muitas das vezes não compartilhadas. Uma em especial por quem ele nutria grande carinho e amor fraterno, era constantemente mencionada em seus casos, não posso deixar de mencionar, dr. Sebastião Lintz, seus olhos sempre se iluminavam ao falar dele.
Homem dos fóruns, isso mesmo, no plural, tio Fábio começou muito novo ainda no antigo. Demolido, para sua perplexidade, sem deixar vestígios. Viu a construção do novo até este se tornar pequeno. Prova disso que, mesmo depois de aposentado, não deixava de lá estar todos os dias a conversar e trocar idéias com seus amigos do coração. Um dia foram “expulsos” da velha cantina, local de encontro onde batia o ponto, para dar lugar a novas salas. O grupo não se intimidou foi se albergar na garagem do prédio. A prosa, o companheirismo puro e verdadeiro não se abalaria por tão pouco. Raro perder um dia lá, tinha verdadeira adoração pelo lugar, mas principalmente por seus amigos.
Datilógrafo exímio, daqueles de dois dedos. Sua destreza na boa e velha Remington chamava a atenção de quem passava e o via trabalhar, parecia que dos tipos sairiam fumaça dada a velocidade. Eram letras para todos os lados. Sem contar a rapidez e vigor ao retornar o carro da máquina, barulho seco, eterno na memória. Nunca se encantou com computador, com muito custo enfrentou as máquinas elétricas.
Seus óculos de fundo de garrafa por várias vezes assustaram seus sobrinhos-netos, meus filhos, e ele adorava brincar de bravo, mas era só por um segundo, pois logo se abria em carinhoso abraço e dizia manso: chora não, sou eu, tio Fábio. As então crianças em seu peito se aninhavam. Unanimidade? Creio que esta não existe. Mas posso apostar. Era homem de poucos desafetos, um ou outro talvez, para confirmar a regra.
Tio Fábio merece um tratado, monografia de sua vida. Suas histórias dariam vários livros. Muitos poderiam dele falar.
Tio Fábio agora se encontra em plano superior, com ele nossa querida Vó Filhinha, tio Zé, Vô Ítalo e outros tantos irmãos.
O Criador vai ter muito trabalho em pôr ordem na casa de agora em diante, tio Fábio chegou. Chamou?
Agora agüenta.
(Aqui no Jornal Correio em pdf)
sexta-feira, outubro 17
JabuticARTE
E quem disse que minha jabuticabeira produz apenas doces frutos?
Produz também moda, mimos e arte, muita arte.
Olha a Vera:
Mais de Vera Vilela em
http://www.veravilela.com
Produz também moda, mimos e arte, muita arte.
Olha a Vera:
Mais de Vera Vilela em
http://www.veravilela.com
quinta-feira, outubro 16
Comecei terapia
Já era hora, carecia de uma limpeza de cabeça e alma. A minha terapeuta é pós-doutorada pela Universidade Esotérica-Astronomica-Grafologica-Runas-Quiromantica-woodstockquiana de Milho Verde - MG, e seu consultório (foto abaixo) é na baixada fluminense. Atende-se todos os convênios. Aceita cartão, pré-datados, nota promissória vencida ou cestas-básicas e até ações da bolsa de NY.
quarta-feira, outubro 15
Moleque
A delicia de ser para sempre moleque.
Faltou João Lucas aqui.
Faltou João Lucas aqui.
E me fala de coisas bonitas
Que eu acredito que não deixarão de existir
Amizade, palavra, respeito, caráter,
Bondade, alegria e amor
Pois não posso, não devo, não quero
Viver como toda essa gente insiste em viver
E não posso aceitar sossegado
Qualquer sacanagem ser coisa normal
Bola de meia
Bola de gude
O solidário não quer solidão
Toda vez que a tristeza me alcança
O menino me dá a mão
Há um menino
Há um moleque
Morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto fraqueja
Ele vem prá me dar a mão
Bituca e Brant
terça-feira, outubro 14
Para haiga Jabuticaba
Lindo em seu recanto.
Em encanto musical
De passarinho melódico canto
Emoção de ver bela junção
de alegria pronto pranto.
outubro- 2008
Em encanto musical
De passarinho melódico canto
Emoção de ver bela junção
de alegria pronto pranto.
outubro- 2008
Veja no recanto de Ly AQUI
segunda-feira, outubro 13
Ensaio I
sexta-feira, outubro 10
quinta-feira, outubro 9
Tempo passa
Lembram do nascimento em 29/09?
Não? então veja reveja clicando AQUI
Dez dias depois...
Todos a cara da mãe, esculpidos em carrara.
Clique para detalhes
Não? então veja reveja clicando AQUI
Dez dias depois...
Todos a cara da mãe, esculpidos em carrara.
Clique para detalhes
Campo
quarta-feira, outubro 8
Obstinação
segunda-feira, outubro 6
Tecno-denuncismo
Tecno-denuncismo
Quase todo dia acompanhamos pela televisão casos de pessoas sendo gravadas ou filmadas fazendo algo errado. Recebendo propina, vendendo lugar em alguma fila, alguém sempre tramando. Estelionatos, falsos seqüestros, golpes variados.
As novas tecnologias estão ajudando em muito este tipo de ação. Atualmente quase todo celular grava e fotografa. Registre-se, o meu não. Sou um tanto conservador para essas coisas, telefone é para telefonar e pronto. Vemos autoridades e íntegras pessoas sendo grampeados com freqüência. Conversas divulgadas fazendo às vezes estragos irreparáveis.
Bravo! Palmas para as denúncias de mal feitos. Os desonestos e ladinos que se cuidem. Este é o lado bom da tecnologia, quando usada para o bem comum.
Porém essa moeda parece ter só uma face. Senão vejamos: Alguém se lembra de ver ou ouvir uma gravação ou micro câmera em ação por um bom atendimento público? Daqueles em que o cidadão é bem tratado e seu problema resolvido por gente humana educada e bem disposta e não por máquinas do tipo agora disque 1 para isso, disco 2 para aquilo?
Alguém já passou um dia com o servidor público atendendo e ouvindo constantes ameaças do tipo: Sabe com quem está falando? Ou sendo ameaçado de ser exposto à mídia mundo cão e sensacionalista caso o seu pedido não seja atendido IMEDIATAMENTE?
Alguém se lembra de algum grampo em telefone de serviço público que bem funcione? Com resolutividade, e pelo qual o contribuinte pode se orgulhar de tê-lo à sua disposição?
A mídia divulgaria uma faixa estendida às portas de uma UAI em agradecimento ao serviço e carinho recebidos por um familiar? E aquela médica do centro de saúde do bairro, que a todos recebe com largo sorriso e atenção, como fossem amigos pessoais?
Nada, nadinha. Não dá Ibope. O bem feito não chama atenção.
Tá certo, muitos dirão, mas o servidor público quando atende bem não faz mais do que a obrigação, ele está lá é para isso mesmo. Não tiro um milímetro da razão de quem assim pensa, é dever bem atender, mas também não é para ser mal tratado e agredido a torto e à direita.
O outro lado do níquel a que me referia mostra um servidor de qualquer esfera que seja, que historicamente é mal remunerado, desmotivado, comumente taxado de preguiçoso e que ouve com freqüência que se ele ali está, com certeza é por incompetência pois não consegue outro emprego, isso é que se fala por aí, o publicável.
Não se imagina que ali está uma pessoa comum, de carne e osso, que tem sentimentos e que, na maioria das vezes é apaixonado pelo que faz e ali serve por opção e prazer? É tão difícil assim? Desconheço classe de trabalhador com maior problema de auto-estima abalada do que o servidor público.
Gente ruim de serviço tem em qualquer lugar, mas generalizar é discriminatório e vil.
A tecnologia a favor do denuncismo pode derrubar presidentes e colocar atrás das grades criminosos, mas pode ser também injusta e precipitada. Pode e muitas vezes joga pedras em pessoas e instituições sérias e honradas.
Quando bem usada é digna de crédito e aplausos, mas cá pra nós, poderia de vez em quando servir também para mostrar que nem só de podres vive a humanidade, afinal, como disse a anárquica e maravilhosa Leila Diniz, uma mulher que viveu anos luz de seu tempo: "- Cafuné na cabeça, meu querido, até de macaco."
Quase todo dia acompanhamos pela televisão casos de pessoas sendo gravadas ou filmadas fazendo algo errado. Recebendo propina, vendendo lugar em alguma fila, alguém sempre tramando. Estelionatos, falsos seqüestros, golpes variados.
As novas tecnologias estão ajudando em muito este tipo de ação. Atualmente quase todo celular grava e fotografa. Registre-se, o meu não. Sou um tanto conservador para essas coisas, telefone é para telefonar e pronto. Vemos autoridades e íntegras pessoas sendo grampeados com freqüência. Conversas divulgadas fazendo às vezes estragos irreparáveis.
Bravo! Palmas para as denúncias de mal feitos. Os desonestos e ladinos que se cuidem. Este é o lado bom da tecnologia, quando usada para o bem comum.
Porém essa moeda parece ter só uma face. Senão vejamos: Alguém se lembra de ver ou ouvir uma gravação ou micro câmera em ação por um bom atendimento público? Daqueles em que o cidadão é bem tratado e seu problema resolvido por gente humana educada e bem disposta e não por máquinas do tipo agora disque 1 para isso, disco 2 para aquilo?
Alguém já passou um dia com o servidor público atendendo e ouvindo constantes ameaças do tipo: Sabe com quem está falando? Ou sendo ameaçado de ser exposto à mídia mundo cão e sensacionalista caso o seu pedido não seja atendido IMEDIATAMENTE?
Alguém se lembra de algum grampo em telefone de serviço público que bem funcione? Com resolutividade, e pelo qual o contribuinte pode se orgulhar de tê-lo à sua disposição?
A mídia divulgaria uma faixa estendida às portas de uma UAI em agradecimento ao serviço e carinho recebidos por um familiar? E aquela médica do centro de saúde do bairro, que a todos recebe com largo sorriso e atenção, como fossem amigos pessoais?
Nada, nadinha. Não dá Ibope. O bem feito não chama atenção.
Tá certo, muitos dirão, mas o servidor público quando atende bem não faz mais do que a obrigação, ele está lá é para isso mesmo. Não tiro um milímetro da razão de quem assim pensa, é dever bem atender, mas também não é para ser mal tratado e agredido a torto e à direita.
O outro lado do níquel a que me referia mostra um servidor de qualquer esfera que seja, que historicamente é mal remunerado, desmotivado, comumente taxado de preguiçoso e que ouve com freqüência que se ele ali está, com certeza é por incompetência pois não consegue outro emprego, isso é que se fala por aí, o publicável.
Não se imagina que ali está uma pessoa comum, de carne e osso, que tem sentimentos e que, na maioria das vezes é apaixonado pelo que faz e ali serve por opção e prazer? É tão difícil assim? Desconheço classe de trabalhador com maior problema de auto-estima abalada do que o servidor público.
Gente ruim de serviço tem em qualquer lugar, mas generalizar é discriminatório e vil.
A tecnologia a favor do denuncismo pode derrubar presidentes e colocar atrás das grades criminosos, mas pode ser também injusta e precipitada. Pode e muitas vezes joga pedras em pessoas e instituições sérias e honradas.
Quando bem usada é digna de crédito e aplausos, mas cá pra nós, poderia de vez em quando servir também para mostrar que nem só de podres vive a humanidade, afinal, como disse a anárquica e maravilhosa Leila Diniz, uma mulher que viveu anos luz de seu tempo: "- Cafuné na cabeça, meu querido, até de macaco."
sexta-feira, outubro 3
Assinar:
Postagens (Atom)